
Já faz quase 20 anos, de modo que as cenas estão um pouco apagadas em minha memória. Mas recordo que quando ainda era visitante em Nova Gokula, nos idos de 87-88, recebi mais ou menos as seguintes instruções:Os sastras védicos informam que:Deve-se adorar o guru como o autêntico representante de Deus, e honrá-lo como se honra a Deus.Caso o guru por qualquer motivo não queira mais ser mestre espiritual, ou demonstre não mais agir de acordo com o que os sastras definem para uma pessoa nessa posição (fique em maya) o discípulo deve: • mostrar empatia quanto à decisão e situação do mestre;• tentar compreender seus motivos, razões, causas;• tentar reverter essa situação, conversando com ele.Caso o guru reconsidere sua decisão, ou retorne a sua consciência correta, o discípulo deve demonstrar o mesmo respeito e honra de sempre. Caso o guru continue irredutível, o discípulo deve procurar outro guru para continuar seu treinamento e avanço espiritual. O discípulo nunca deve se considerar superior ao seu mestre espiritual, pois mesmo que venha a avançar muito, o seu mestre também está sempre avançando, de modo que o discípulo nunca alcança o mestre. De fato, o discípulo deve considerar que qualquer avanço que faça, se deve unicamente às bênçãos de seu mestre espiritual. Esse avanço de ambos, mestre e discípulo, continua acontecendo mesmo que os dois já tenham alcançado o mundo espiritual, pois Krishna é infinito, e está eternamente se expandindo. Penso que essas instruções são védicas, válidas em qualquer lugar, tempo e circunstância, de grande bom senso, inteligência e equilíbrio emocional, e representam um relacionamento de grande maturidade e de altíssimo nível entre mestre e discípulo. Temos a tendência de ver uma queda eventual de um discípulo e principalmente do mestre como algo escandaloso: nossa cultura materialista ensina isso, os meios de comunicação reforçam isso, e vemos essa queda como um motivo para não mais nos esforçarmos. Mas a cultura e etiqueta védicas são perfeitas, e já prevêem todas as atitudes e ações corretas para dirimir ao máximo as conseqüências prejudiciais de uma dificuldade passageira, ainda que grave. Uma queda eventual não representa necessariamente pouca compreensão espiritual do mestre ou falta de sinceridade do discípulo: mostra que realmente nossa situação neste mundo é muito difícil, que os sentidos e a mente são muito fortes, e que precisamos nos apoiar mutuamente com grande tolerância e humildade. Mesmo em uma condição caída, o devoto nunca deixa de avançar, pois está realizando muitas advertências e descrições védicas quanto a essa condição não-devocional. Não precisamos incentivar, apoiar ou imitar uma situação insatisfatória, mas também não devemos ter atitudes destrutivas, que não ajudarão em nada a restabelecer a consciência de Krishna dos membros da Sociedade que estejam passando por dificuldades.
Acredito que o grande obstáculo para entender, aceitar e aplicar estas instruções seja o nosso condicionamento material atual: relacionamentos fortemente baseados na concorrência (em detrimento da colaboração mútua), uma tradição militar intemporal de castigar fortemente os traidores da "causa", e uma religiosidade milenar que combina fé cega com condenação eterna dos pecadores. São muitos anarthas (coisas desfavoráveis à vida espiritual) fortemente arraigados no coração. Mas são essas instruções védicas relativas a um relacionamento maduro, conduzido inteligentemente, de um equilíbrio emocional impar, indo desde a escolha criteriosa do mestre espiritual, passando pela manutenção adequada do relacionamento mestre-discípulo e culminando em fé e devoção inabaláveis em guru, sastra e sadhu, que fazem a diferença, e permitem o casamento perfeito entre o que se lê, o que se fala, o que se faz, e o que se sente.
Medite nisso.
Por Gopala Dasa (HDG)
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