Dedicado a Sua Divina Graça A.C. Bhaktivedenta Swami Prabhupada e Gurudeva Srila Dhanvantari Swami

Dedicado a Sua Divina Graça A.C. Bhaktivedenta Swami Prabhupada e Gurudeva Srila Dhanvantari Swami
Jagad Guru Srila Prabhupada

quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

Passatempos Infantis do Senhor Chaitanya

Quarto e último capítulo do Chaitanya-Bhagavata cedido em cortesia pela BBT Brasil. O Chaitanya-Bhagavata, em seu total de cinquenta e cinco capítulos, encontra-se disponível para compra clicando aqui.

Passatempos Infantis do Senhor Chaitanya

Da obra Sri Chaitanya-Bhagavata,
De Vrindavana dasa Thakura,
Adi-khanda, Capítulo 6

O Senhor Chaitanya, assim como o pequeno Gopala Krishna, desfrutou de muitos passatempos. Passado algum tempo, era chegado o dia para o início de Sua educação formal. Em um momento auspicioso de um dia auspicioso, o grande brahmana Jagannatha Misra formalmente colocou na mão de seu filho o giz de escrever. Após alguns dias, na presença de todos os Seus amigos, Nimai [Chaitanya] passou pela cerimônia de cuda-karana, quando os garotos brahmanas têm a cabeça raspada, com exceção da sikha. A cerimônia de karna-beda, quando se ouvem os Vedas pela primeira vez, também foi observada. Todos ficaram deveras impressionados vendo que Nimai era capaz de escrever todas as letras do alfabeto as tendo visto pela primeira vez. No decorrer de dois ou três dias, o Senhor havia aprendido todas as combinações de letras. Repetidas vezes, Ele escrevia os nomes do Senhor – diversos nomes unidos como se em uma guirlanda. Dia e noite, Ele escrevia: “Rama”, “Krishna”, “Murari”, “Mukunda”, “Vanamali”. Ele estudava com grande avidez. Narayana, o Senhor dos planetas Vaikuntha, agora ia para a escola com um grupo de garotos. Apenas as almas mais afortunadas e piedosas de Nadiya podiam presenciar tais passatempos. Ouvindo-O recitar com grande doçura o alfabeto Bengali, “ka, kha, ga, gha”, todos eram imediatamente cativados.

O Cantar do Nome de Hari e a Oferenda de Ekadasi

Todo passatempo executado pelo Senhor Chaitanya era de impossível compreensão. Ele ansiava por coisas que eram muito difíceis de serem auferidas. Quando percebia não ser capaz de pegar os passarinhos que Ele via voando no céu, o pequeno Nimai então chorava em profundo desapontamento. Ele ansiava pegar a lua e as estrelas. Incapaz de tê-las, Ele Se debatia batendo Suas mãos e pés violentamente contra o chão. As pessoas O colocavam no colo e tentavam confortá-lO, mas Ele Se recusava a Se acalmar. Ele dizia chorando: “Mas Eu quero! Eu quero!”. Havia apenas uma solução para o choro do Senhor. Apenas quando Ele ouvia o som do nome do Senhor Hari, Ele parava de chorar. Todos batiam palma e cantavam: “Hari! Hari!”. Somente assim Nimai esquecia Sua aflição e ficava calmo. O frequente cantar dos nomes do Senhor Hari para o prazer de Nimai transformou a casa de Jagannatha Misra na transcendental morada de Vaikuntha.

Um dia, mesmo com todos cantando bem alto o nome do Senhor Hari, o pequeno Sri Chaitanya continuou chorando. Todos disseram: “Querido Nimai! Escute! Estamos cantando os nomes do Senhor Hari. Dance para nós!”. Mas, sem dar ouvidos a ninguém, Nimai continuou chorando. “Querida criança, diga-nos por que Você chora tanto”. Todos disseram: “Querido, diga-nos o que Você quer. Traremos para Você qualquer coisa que queira. Então, pare de chorar”. O Senhor disse: “Se vocês querem salvar Minha vida, então vão sem demora à casa de dois brahmanas. Jagadisa Pandita e Hiranya Pandita são ambos grandes devotos do Senhor. Há algo na casa deles que Eu quero ter. Hoje é ekadasi. Eu quero comer os alimentos que eles ofereceram ao Senhor Vishnu neste dia. Se Eu puder comer os remanentes daquelas oferendas, Eu ficarei saudável e calmo novamente”.

Ouvindo tal pedido impossível de se realizar, Mãe Saci ficou aflita. O que Ele queria não era nem comum socialmente nem sancionado pelas escrituras. Todos sorriram ante Suas palavras infantis e prometeram: “Tudo bem, nós Lhe daremos tudo o que Você quiser, mas agora pare de chorar”. Jagadisa Pandita e Hiranya Pandita eram Vaishnavas de primeira classe e amigos inseparáveis de Sri Jagannatha Misra. De fato, Jagannatha Misra os considerava tão queridos quanto sua própria vida. Quando souberam do pedido de Nimai, os dois brahmanas foram tomados de prazer. Os dois brahmanas declararam: “Que história extraordinária! Nunca ouvimos falar de uma criança tão inteligente. Como Ele sabia que hoje é ekadasi e que a oferenda de alimento à Deidade foi opulenta? Agora entendemos a beleza excepcional da criança. O Senhor Krishna Gopala deve estar vivendo dentro de Seu corpo. O Supremo Senhor Narayana age através deste garoto. Sentado em Seu coração, o Senhor faz com que Nimai fale de maneiras impressionantes”. Pensando dessa maneira, os dois brahmanas Vaishnavas trouxeram toda a prasadam para a casa do Senhor e, com ilimitada felicidade, deram tudo para Ele. “Filho, por favor, coma esta prasadam”, eles disseram a Nimai. “Dessa maneira, nosso desejo de comprazer o Senhor Krishna será realizado”.

Unicamente através da misericórdia de Krishna pode uma pessoa desenvolver inteligência espiritual para prestar serviço devocional. Com exceção dos devotos do Senhor, ninguém é verdadeiramente inteligente. Sem se ocupar em serviço devocional, não se pode conhecer a verdade sobre o Senhor Supremo, o Senhor Sri Chaitanya Mahaprabhu, de cujos poros emanam os ilimitados universos.

Hiranya e Jagadisa, que há vidas e vidas vinham atuando como servos do Senhor, contemplaram para sua plena satisfação como o Senhor Supremo desfrutava de Seus passatempos como um menino brahmana. O Senhor alegremente recebeu a oferenda de Seus devotos e provou um pouco de cada preparação. O Senhor comeu a prasadam com grande prazer. Assim, todo o Seu capricho foi mitigado. Todos na casa voltaram a cantar “Hari! Hari!”, e o Senhor comia e dançava enquanto ouvia o cantar de Seus nomes. Um pouco da prasadam que Ele comia às vezes caía no chão ou nos braços ou pernas de alguém. Dessa maneira, o Senhor do universo, o controlador das três classes de misérias e rei dos trinta milhões de semideuses, desfrutava de Seus passatempos transcendentais.

Queixas e Travessuras Transcendentais

A Suprema Personalidade de Deus, que é descrito em todos os Vedas e Puranas, brincava à vontade no quintal de Shacidevi. Crescendo um pouco mais, Nimai Se absorveu completamente no humor desquietado de um jovem garoto. Juntando-Se com outros garotos brahmanas igualmente inquietos, Ele desfrutou de muitos passatempos. Acompanhado de Seus amigos, Ele vagava livremente de um lugar a outro. Ninguém tinha o poder de fazê-lO parar quieto. Encontrando-Se com outro garoto de Sua idade, Nimai implicava com ele e o garoto retribuía as provocações. Assim se dava inicio a ferrenhas e longas discussões. Porque Nimai era muito poderoso, Ele e Seus amigos sempre saíam vitoriosos nessas discussões. Os adversários iam embora derrotados. Coberto de poeira e gotejado de tinta preta de escrever, Nimai parecia muito encantador àqueles que O viam.

Ao meio dia, após terminarem seus exercícios de ouvir e escrever, Nimai e Seus amigos iam se banhar e se divertir no Ganges. Mergulhando nas águas do Ganges, Nimai e Seus amigos desafiavam uns aos outros espirrando água. Quem é capaz de descrever a opulência de Nadiya quando o Senhor Supremo estava pessoalmente presente ali? Inúmeras pessoas se banhavam em cada ghata do rio. É impossível dizer quantos santos, ascetas, sannyasis, pais de família e crianças se encontravam ali. O Senhor desfrutava de muitos passatempos aquáticos com Seus amigos. Ora Ele mergulhava, ora boiava com a correnteza do rio e ora participava de jogos estabelecidos por eles mesmos. Tendo as brincadeiras aquáticas por pretexto, o Senhor espirrava água com Seus divinos pés de lótus em quem quer que estivesse próximo a Ele; beneficiando, destarte, tais afortunados banhistas.

As pessoas diziam a Nimai que Ele não devia ser tão traquinas, mas Ele não dava ouvidos a ninguém. E, sendo Ele o nadador mais veloz, ninguém podia pegá-lO. Contaminando as pessoas de diferentes maneiras, umas vezes tocando em seus corpos e outras vezes cuspindo neles, Nimai obrigava que todos tomassem banho várias vezes. Incapazes de pegar Nimai para repreendê-lO, os brahmanas iam enfurecidos se queixar com o pai do garoto. “Querido amigo Misra, por favor, escute”, um cavalheiro disse. “Venho até o senhor para me queixar da má conduta de seu filho. Ele não nos deixa executar nossas abluções diárias no Ganges de maneira apropriada”. Outro se queixou em seguida: “Ele espirra água em nossos rostos e perturba nossa meditação”. Outro homem então tomou a palavra: “Ao interromper minha meditação, Ele disse: ‘Em quem você está meditando? Eu sou o próprio Senhor Narayana, agora presente ante seus olhos nesta era de Kali”. Todos apresentavam diferentes reclamações. Um homem dizia: “Ele roubou minha Shiva-linga”, e outro logo adicionava: “E também roubou minhas roupas”. Outro banhista reportou: “Preparando-me para adorar o Senhor Vishnu, eu trouxera flores, grama durva, alimentos para serem oferecidos e também um trono para Ele. Então, enquanto me banhava, seu filho veio, sentou-Se no trono, comeu todas as oferendas e então foi embora correndo. Ele então voltou e me disse: ‘Por que você está triste? O Senhor de sua adoração comeu pessoalmente sua oferenda’.”.

Diferentes pessoas seguiam se queixando. Um brahmana disse: “Eu entrei na água para recitar o Gayatri e, parecendo vir do nada, Nimai veio por debaixo d’água e me derrubou puxando o meu pé. Outro homem disse: “Meu dhoti e minha cesta de flores são invariavelmente roubados todos os dias”. Ao que outro com problema similar acrescentou: “Ele sempre rouba o meu Bhagavad-gita”. Outro, um tanto exasperado, colocou então suas queixas: “Ele coloca água no ouvido de meu filho pequeno e o faz chorar ruidosamente”. Um novo homem tomou a palavra em seguida: “Ele sobe por minhas costas até ficar de pé em meus ombros. Sobre meus ombros, Ele grita ‘Eu sou o senhor Shiva!’ e então mergulha na água”. “Ele Se senta em meu altar”, outro homem começou a falar, “come toda a comida a ser oferecida e então adora o Senhor Vishnu. Além disso, acompanhado por outros meninos irrequietos, Ele joga areia em todos que acabaram de se banhar. Uma de suas piores brincadeiras, porém, é que, enquanto os homens e as mulheres estão se banhando, Ele coloca as roupas das mulheres na beira de onde os homens estão se banhando e as roupas dos homens onde estão as mulheres. Dessa maneira, todos ficam constrangidos. Querido Jagannatha Misra, você é meu amigo querido; eu, todavia, tenho de lhe avisar: seu filho age dessa maneira diariamente e o dia todo. Ele passa seis horas sem sair da água. Como Seu corpo poderá permanecer saudável?”.

Entrementes, muitas garotas jovens, revoltadas com as travessuras de Nimai, queixavam-se com Shacidevi. Elas disseram a Shaci: “Por favor, respeitável mãe, ouça de nós sobre o mau comportamento de seu filho. Ele rouba nossas roupas e usa palavras insultuosas conosco. Quando tentamos corrigir Sua fala, Ele joga água em nós e inicia uma discussão. Em cumprimento aos nossos votos religiosos, trazemos frutas e flores diariamente ao Ganges, mas Ele pega nossas oferendas e estraga tudo. Ele espera até que terminemos nossas abluções e então, junto com Seus amigos igualmente irrequietos, atira areia em nós. Ele caminha silenciosamente por detrás de nós e, de repente, grita bem alto em nossos ouvidos, quase nos matando de susto”. Outra garota então disse: “Ele sempre atira água no meu rosto. Ele também coloca sementes de okada em meu cabelo, que coçam e são muito difíceis de se tirar”. Outra voz queixou-se interrompendo a anterior: “Nimai fica dizendo que irá Se casar comigo”. “Ele age dessa maneira diariamente. Ele é filho do rei por acaso?”, elas inquiriram. “Tudo o que seu filho Nimai faz é tal qual as atividades do filho de Nanda Maharaja. Nós ouvimos algumas histórias sobre Krishna, o filho de Nanda. Se levarmos até nossos pais e mães essas queixas, eles certamente virão discutir com você. Você deveria corrigir seu filho imediatamente. Sua conduta certamente não é bem-vinda em uma cidade como Navadvipa”.

Tendo ouvido suas palavras, a mãe de Sri Chaitanya Mahaprabhu sorriu, abraçou cada uma das jovens e falou-lhes palavras confortantes. “Quando Nimai voltar para casa hoje, eu irei bater nEle com uma vara e também irei amarrá-lO. Assim, Ele nunca mais causará dificuldade para os outros”. Todas elas respeitosamente colocaram a poeira dos pés de Mãe Shaci sobre suas cabeças e procederam para o Ganges para se banharem novamente. Todo aquele que era importunado pelas travessuras do Senhor provava intensa felicidade transcendental no íntimo de seu coração. Quando os brahmanas se queixaram com Jagannatha Misra, eles não estavam irritados de verdade. Todavia, quando Jagannatha Misra ouviu sobre o que Nimai fazia, ele rugiu de raiva. Ele disse: “Já que Ele está sempre incomodando a todos com essas brincadeiras, eu irei proibi-lO definitivamente de ir Se banhar no Ganges”. Todos vinham tentando interferir no comportamento do garoto, mas, até então, ninguém havia sido bem sucedido. Jagannatha Misra então decidiu: “Eu irei bater nEle com uma varinha”.

A Incastigável e Inconcebível Personalidade de Deus

Porque Ele é a Superalma presente no coração de todos, o Senhor Chaitanya sabia que Jagannatha Misra estava muito irado procurando por Ele. O Senhor Chaitanya seguiu com Seus passatempos esportivos nas águas do Ganges com Seus amigos. Dentre todos os garotos, Ele era o mais encantador. As jovens donzelas se apiedaram de Nimai e disseram a Ele: “Escute, Visvambhara! Escute! Jagannatha Misra está atrás de Você! Ele está vindo para cá! É melhor Você fugir daqui sem demora!”. Pouco antes da chegada de Sri Misra, o Senhor fugiu de onde os meninos brincavam. Assustadas, as jovens filhas dos brahmanas também correram dali. Nimai já havia instruído Seus amigos quanto ao que dizerem quando Seu pai perguntasse de Seu paradeiro. Eles deveriam dizer: “Seu filho não esteve aqui para Se banhar conosco. Depois da aula, Ele voltou para casa. Na verdade, nós também estamos esperando por Ele”. Após deixar esta instrução, o Senhor voltou para casa por um caminho diferente. Assim, Jagannatha Misra chegou ao local de banho sem se encontrar com Ele. Ali, na beira do Ganges, Jagannatha Misra olhou para as quatro direções, mas não pôde encontrar seu filho nem entre os garotos nem em nenhuma outra parte. Jagannatha Misra perguntou nervoso: “Para onde foi Visvambhara?”. Os garotos responderam: “Ele não veio Se banhar aqui hoje. Ele voltou para casa pelo caminho habitual. De fato, nós também estamos esperando por Ele”. Sri Misra continuou procurando por seu filho, mas, incapaz de encontrá-lO, tudo o que podia fazer era bufar de raiva.

Os mesmos brahmanas que anteriormente haviam, em um humor espirituoso, apresentado diversas queixas, foram mais uma vez até Sri Misra e falaram com ele. “Visvambhara correu para casa porque estava com medo. Você deveria ir para casa e conversar com o garoto. Permita-nos acompanhá-lo para nos certificarmos de que você não fará nada de que possa se arrepender depois. Se Nimai fizer esse tipo de travessura novamente, então nós pessoalmente pegaremos o garoto e O levaremos até você. Todas aquelas queixas que fizemos contra Nimai em sua residência foram feitas de forma gracejosa. Na verdade, não se pode encontrar nos três mundos fortuna como a sua. Nimai é um filho tão amável que os membros da família dEle nunca são tocados pela fome, pela sede, pela lamentação ou por qualquer outro sofrimento material. Seu filho é a Suprema Personalidade de Deus. Certamente você é muito afortunado por poder servir diariamente Seus pés de lótus. Mesmo que Ele cometa milhões de ofensas, sempre nos lembraremos de Visvambhara dentro de nossos corações”. Esses brahmanas vinham se ocupando nascimento após nascimento como devotos do Senhor Krishna. Esta é a razão para eles serem dotados com a inteligência superior necessária para a prestação do transcendental serviço devocional ao Supremo. O Senhor Supremo desfrutou de muitos passatempos com tais servos íntimos. Uma pessoa ordinária não pode compreender essas atividades do Senhor.

Jagannatha Misra disse: “Nimai é como um filho para vocês. Se vocês levarem Suas ofensas a sério, então eu estarei arruinado. Por favor, perdoem as atividades dEle”. Após abraçar afetuosamente cada um dos brahmanas, Jagannatha Misra voltou satisfeito para casa. Tendo tomado outro caminho, a Suprema Personalidade de Deus, o Senhor Visvambhara, já havia chegado em casa. Brilhando como a lua, Ele carregava belos livros debaixo de Seus braços. Pequenas manchas de tinta de escrever decoravam diferentes partes do corpo de compleição dourada do Senhor. Era como se uma fragrante champaka dourada houvesse atraído um enxame de abelhões.

“Mãe!”, Ele chamou, “Eu vou tomar banho, Eu quero o Meu óleo”. Ouvindo as palavras de seu filho, o coração de Shaci se encheu de felicidade. Ela não pôde ver em Seu corpo nenhum sinal de que Ele já havia Se banhado. Shacidevi entregou-Lhe o óleo. Em seu coração, ela se perguntava: “Por que os brahmanas e suas filhas jovens falavam daquele jeito sobre o comportamento de Nimai? Todo o Seu corpo está salpicado de tinta preta de escrever, e Ele estava carregando Seus livros e vestindo as mesmas roupas que usava quando foi para a escola”. Nesse momento, Jagannatha Misra chegava em casa. Vendo Jagannatha Misra, Visvambhara imediatamente pulou em seu colo. Com o abraço amoroso do Senhor, Jagannatha Misra perdeu toda a percepção do restante do mundo. Olhando para o rosto de seu filho, ele se afogou em bem-aventurança. Sri Misra pôde ver que o corpo de Nimai estava coberto de poeira e que não havia nenhum sinal de que Ele houvesse Se banhado. Sri Misra ficou realmente surpreso com aquilo. Jagannatha Misra perguntou: “Visvambhara, que plano Você carrega em Seu coração? Por que Você não deixa as pessoas se banharem em paz? Por que Você arruína os arranjos que as pessoas fazem para adorar o Senhor Vishnu? Você não teme o Senhor Vishnu?”.

“Mas hoje Eu nem fui tomar banho ainda! Os garotos foram antes que Eu pudesse ir com eles”, respondeu Nimai. Essas pessoas estão agindo de forma desonesta coMigo. Embora Eu sequer tenha chegado perto delas, elas Me acusam de coisas que não fiz. Se essas pessoas continuarem a apontar falhas no Meu comportamento e continuarem Me acusando de coisas que não fiz, então Eu passarei a Me comportar mal e a criar dificuldade para elas como dizem que faço”. Após dizer essas palavras, o Senhor sorriu e foi Se banhar no Ganges, onde Se encontrou novamente com Seus amigos. Vendo Visvambhara, todos O abraçaram. Quando ouviram sobre a maneira engenhosa com que Ele havia agido, todos riram. Todos O glorificaram dizendo: “Como Você é esperto, Nimai! Você Se livrou de algumas boas chibatadas hoje!”.

Nimai estava novamente ocupado em Suas atividades esportivas aquáticas com Seus amigos. Enquanto isso, Mãe Shaci e Jagannatha Misra consideravam com seriedade o que acontecera. Eles diziam: “Todas as queixas apresentadas contra Nimai certamente não eram mentiras; não havia, no entanto, nenhuma indicação de que Nimai havia Se banhado. Tudo estava de acordo. Seu corpo estava coberto de poeira e Ele estava vestido com as mesmas roupas, que estavam secas. Seu cabelo também estava seco, e Ele carregava Seus livros”. “Eu acho que nosso Visvambhara não é uma pessoa comum”, Sri Misra disse. “Talvez, com a ajuda de Sua potência interna, Yogamaya, a Suprema Personalidade de Deus tenha aparecido pessoalmente em nossa casa como nosso filho. Ou talvez Ele seja um grande santo, cuja identidade foge de meu conhecimento”. Sri Misra, o melhor dos brahmanas, pensava assim sobre a situação. Contudo, quando os dois pais viam seu filho, todas as suas cogitações se dissipavam. Seus corações transbordavam com carinhosa afeição por Nimai, e nada mais lhes importava. Ambos sentiam intensamente a ausência de seu filho. As horas que Nimai passava estudando lhes pareciam dois milênios.

Se os Vedas tivessem dez milhões de formas, cada uma com dez milhões de bocas, ainda assim eles não seriam capazes de descrever a imensa fortuna de Srimati Sacidevi e Jagannatha Misra. Vezes e mais vezes, eu ofereço minhas respeitosas reverências aos pés de Saci e Jagannatha Misra, a quem o Senhor Supremo e controlador de ilimitadas manifestações cósmicas Se submeteu como filho. Assim, o Senhor de Vaikuntha, Sri Visvambhara, desfrutou de maravilhosos passatempos. Devido à energia espiritual do Senhor Supremo, todavia, ninguém era capaz de reconhecer Sua identidade verdadeira.


Tradução de Bhagavan dasa (DvS), revisão de Naveen Krishna dasa (RnS), Prana-vallabha devi dasi (DvS) e Prema Vardhana devi dasi (DvS)

segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

A Liberação de Jagai e Madhai

A obra integral da qual este excerto foi retirado encontra-se disponível para venda clicando aqui.

A Liberação de Jagai e Madhai
Da obra Chaitanya-Bhagavata, de Vrindavana dasa Thakura, Madhya-khanda, Capítulo 13

(parte 1/2)

Na companhia dos devotos, o Senhor Chaitanya afogava-Se na bem-aventurança de Seus passatempos. Àqueles afortunados, Ele revelava a verdade referente a Si. Daqueles absortos no mundo material, Ele Se escondia. Um dia, muito de repente, o Senhor Chaitanya apresentou uma ordem a Nityananda e Haridasa. “Escute, Nityananda. Escute, Haridasa. Sob todos os aspectos, sigam, por favor, a ordem que darei a vocês. Vão a toda casa e mendiguem o seguinte: ‘Por favor, cantem o nome de Krishna, adorem Krishna e ensinem outros sobre Krishna’. Apenas repitam estas palavras e façam com que cantem. Ao fim do dia, voltem e Me reportem o que conseguiram. Implorem para que cantem. Se alguém não ceder ao pedido de vocês, então, com Minha cakra em riste, farei esse alguém em pedaços!”. Ouvindo esta ordem do Senhor; contentes, os vaishnavas sorriram. Quem poderia desobedecer a uma ordem do Senhor Chaitanya? Considerando que o Senhor Nityananda aceitou esta ordem com extremo respeito, qualquer um que não tenha fé nela não passa de um louco insensato.

Público Favorável e Público Hostil

Carregando a ordem do Senhor Chaitanya sobre suas cabeças, Nityananda e Haridasa foram sorridentes para as ruas. Conforme instruídos pelo Senhor, eles iam de casa em casa e pediam: “Por favor, cantem o nome de Krishna, adorem Krishna e ensinem outros sobre Krishna. Krishna é sua própria vida; Krishna é seu verdadeiro tesouro; Krishna sustenta sua vida; portanto, por favor, cantem o nome Krishna”. Assim, seguindo a ordem de Chaitanya, o Senhor dos universos, os dois foram a cada casa de Nadiya. Nas vestes de sannyasis, a única esmola que queriam era que todos cantassem o nome de Krishna, adorassem-nO e ensinassem outros sobre Ele. “Por favor, dêem-nos esta caridade”, eles diziam. Depois de dizerem essas palavras, eles partiam.

Se piedosos eram os residentes da casa, eles ficavam felizes com a visita dos renunciantes. Cada pessoa reagia de maneira diferente aos dois pedintes. Alguns diziam com alegria: “Sim, eu farei isso! Farei sim!”. Outros, contudo, diziam: “Vocês dois estão confusos devido a maus conselhos! A má associação com que se envolveram acabou por enlouquecê-los. Por que querem nos tornar loucos também? Todas as pessoas antes boas e sãs agora são loucas; e tudo por causa da má influência de Chaitanya”. As pessoas que não haviam recebido autorização para entrar na casa de Srivasa quando queriam ver o Senhor Chaitanya dançar afugentavam os dois pregadores dizendo: “Matem-nos! Matem-nos!”. Outra pessoa disse: “Eles são ambos ladrões, indo de casa em casa para roubar. Por que homens santos deveriam se comportar dessa maneira? Se vierem à minha casa novamente com seu pretexto falso, levarei eles à corte real”. Embora ouvissem repetidamente tais palavras, Nityananda e Haridasa apenas riam. Devido ao poder da ordem do Senhor Chaitanya, eles nada tinham a temer. Todos os dias, iam eles de casa em casa. Ao retornarem, contavam tudo em detalhes para o Senhor Chaitanya.

“Quem São Estes Homens? Por que Agem Dessa maneira?”

Certo dia, pelas ruas, Nityananda e Haridasa cruzaram com dois ladrões completamente bêbados. Gigantes em tamanho e com a aparência pior do que a de piratas, as histórias que contavam eram de atos abomináveis, e não havia um único pecado que os dois não houvessem cometido. A despeito de terem nascido em família de brahmanas, ambos bebiam vinho e comiam carne de vaca. Entre seus hábitos, também estavam roubar e incendiar casas alheias. Os dois beberrões desobedeceram às injunções da corte de lá comparecerem, e assim tinham sempre de evitar serem vistos por oficiais da lei. Ao longo de todo o dia, seu tempo era usado bebendo vinho e comendo carne. Eles rolavam pelas ruas públicas; e, quando um via que o outro não estava atento, esse o golpeava com socos. À distância, Nityananda, Haridasa e muitos outros assistiam às palhaçadas dos dois bêbados. Em um momento, eles eram muito carinhosos entre eles dois; mas, logo em seguida, um estava puxando o cabelo do outro. Também gritavam alto palavras obscenas, como aquela iniciada com “c” e aquela iniciada com “b”. Eles destruíam completamente a reputação dos brahmanas de Nadiya. O vinho arruína toda a vida e o caráter de quem o bebe.

Embora tenham cometido todo pecado concebível, os dois ainda estavam livres do maior dos pecados – a blasfêmia a um vaishnava. Dia e noite, eles se associavam com outros alcoólatras. Contudo, eles nunca haviam ofendido um vaishnava. Mesmo que o grupo que se ocupe em criticar os vaishnavas seja de pessoas muito altamente piedosas, todas elas perdem toda a boa fortuna que acaso tivessem. Mesmo que os ofensores sejam sannyasis, em virtude da ofensa aos vaishnavas, devem ser considerados mais baixos do que os bêbados. Isto porque os alcoólatras ainda têm chance de serem liberados, mas, quanto aos blasfemadores, toda a esperança já se perdeu. Caso uma pessoa critique os vaishnavas, mesmo que tenha estudado todas as escrituras, sua inteligência é destruída. No caso de uma pessoa que critica o Senhor Nityananda, não apenas sua inteligência é destruída, senão que ela é destruída por completo.

Enquanto rolavam pelo chão, os dois bêbados brigavam trocando socos. Mantendo-se afastados, Nityananda e Haridasa assistiam. O Senhor Nityananda voltou-Se a um grupo qualquer na multidão de espectadores e perguntou a eles: “Quem são estes homens? Por que agem dessa maneira?”. Eles responderam: “Goswami, estes dois homens são brahmanas. Seus pais descendem de famílias muito exaltadas. Seus membros familiares, que há muitas gerações vivem em Nadiya, jamais tiveram qualquer mácula em termos de reputação. Tais homens traíram a tradição de honradez de sua família. Desde pequenos que assim se ocupam em atividades pecaminosas. Vendo quão mal se comportavam, a família deles os renegou. Como dois desterrados, eles vagueiam aqui e ali com outros beberrões. Quando os vêem, as pessoas sentem medo considerando que a qualquer momento eles podem incendiar suas casas. Eles são ladrões, alcoólatras e comedores de carne; não há nenhum pecado que eles não tenham cometido”.

Nityananda Decide Liberar Jagai e Madhai

Ao ouvir a descrição dos dois, o coração do Senhor Nityananda apiedou-se deles, e Ele decidiu que iria liberá-los. Ele pensou: “O Senhor Chaitanya descendeu a este mundo para salvar as almas mais caídas, e quem pode ser mais degradado do que esses dois? Como Chaitanya Mahaprabhu oculta Suas glórias e opulências; sem saberem de Sua identidade verdadeira, as pessoas zombam dEle. Se Meu Senhor, entretanto, for misericordioso com esses dois, então o mundo inteiro saberá de Seu poder supremo”, considerou Nityananda Prabhu. “Caso Eu seja capaz de fazer com que esses dois recobrem a Consciência de Krishna original deles, então Eu, Nityananda, serei um verdadeiro servo do Senhor Sri Chaitanya. Os dois estão tão bêbados que sequer sabem quem são. Se eles puderem se perder dessa mesma forma no cantar do santo nome do Senhor Krishna, se puderem exclamar o nome de Meu Senhor enquanto choram, então Minha pregação terá sido bem-sucedida. Quando tocadas pela sombra de um dos dois, as pessoas correm para se banhar no Ganges sem nem mesmo retirarem suas roupas. Se, quando estas mesmas pessoas virem os dois, considerarem que tal visão é tão purificante quanto um banho no Ganges, então Me sentirei digno de Meu nome e feliz Me sentirei ao escrevê-lo”.

As glórias e a misericórdia do Senhor Nityananda são um oceano sem costa. Para libertar os mais caídos é a razão de Seu aparecimento neste mundo. Após pensar conSigo dessa maneira, Ele sugeriu que Haridasa observasse os dois bêbados: “Olhe, Haridasa, veja como estão em péssimo estado. Apesar de terem nascido em uma família brâmane, eles agem tão mal que não lhes há escapatória para as punições infernais de Yamaraja. Mesmo quando os muçulmanos o tentavam matar, você seguiu indulgente para com eles em seu coração. Se seu coração também se apiedar desses dois homens, certamente o Senhor também concederá a eles a liberação. O próprio Senhor disse ser incapaz de ir contra seus desejos. Você deseja, e Ele dispõe. Com o nosso Senhor Chaitanya liberando estes dois homens deploráveis, deixemos que todos vejam quão magnânimo Ele é! Da mesma forma que cantam os Puranas sobre a liberação de Ajamila, que todos os mundos testemunhem a liberação destes dois pecadores”.

Haridasa conhecia muito bem a verdade referente à posição do Senhor Chaitanya. Assim, no íntimo de seu coração, Haridasa sabia que aqueles dois já estavam salvos. Haridasa disse a Nityananda: “Por favor, ouça, ó Senhor. Tudo o que Você deseja certamente o Senhor Chaitanya realiza. Você me engana dizendo que eu posso falar com o Senhor porque eu sou um animal e preciso ser enganado; Você age repetidamente dessa maneira apenas para bondosamente me lembrar de minha posição baixa”. Sorrindo, o Senhor Nityananda abraçou Haridasa e disse de maneira muito gentil: “Cumprindo a ordem do Senhor, falemos a esses dois bêbados a mensagem de Sri Chaitanya Mahaprabhu. O Senhor instrui que todos cantem o nome de Krishna, especialmente os mais degradados. Falar com estes dois pecadores é o nosso dever. Eles cantarem ou não os santos nomes, depende do Senhor”.

Dois Sannyasis em Apuros

Tomada a decisão, Nityananda e Haridasa colocaram-se em direção aos dois para repetirem a mensagem do Senhor Chaitanya. As pessoas piedosas que estavam próximas, no entanto, disseram a Nityananda e Haridasa: “Para manterem suas vidas seguras é melhor não se aventurarem a se aproximar deles. Próximos a esses dois homens, sempre tememos por nossas vidas. Como poderemos suportar ver vocês dois se aproximando deles? Porque desde muito se ocupam eles em matar brahmanas e em abater vacas, não esperem que eles possam entender a posição gloriosa de um sannyasi!”. A despeito dos avisos, cantando repetidamente o nome de Krishna, eles se aproximaram dos dois pecadores. Aproximando-se o bastante para que eles pudessem ouvir, Nityananda e Haridasa repetiram alto a mensagem do Senhor Chaitanya: “Digam Krishna, adorem Krishna, cantem o nome de Krishna. Krishna é sua mãe, Krishna é seu pai, e Krishna é seu tesouro e sua vida. O Senhor Krishna descendeu a este mundo unicamente para salvar todos vocês. Portanto, abandonem, por favor, suas atividades pecaminosas e adorem o Senhor Krishna”.

Ouvindo tais palavras pronunciadas com autoridade, os dois alcoólatras levantaram suas cabeças e olharam para os dois pregadores com seus olhos vermelhos em fúria. Ao verem a quem pertenciam as vozes, eles fitaram os dois sannyasis e gritaram: “Pegue-os! Pegue-os”, e colocaram-se a correr atrás deles. Nityananda e Haridasa fugiram às pressas, enquanto os dois bêbados corriam atrás deles e gritavam. Seus gritos eram insultosos, e, assustados, os dois devotos fugiam deles. As pessoas começaram a dizer: “Nós os avisamos. Não tendo nos ouvido, agora correm perigo os dois sannyasis”. Dentro de seus corações, os materialistas e ofensores riam e maliciosamente pensavam: “É bem apropriado que o Senhor Narayana puna esses charlatões”. Já os brahmanas piedosos diziam: “Krishna, proteja-os! Krishna, proteja-os!”. Com medo, todos se dispersaram. Os devotos corriam em fuga e os dois vadios seguiam atrás deles. Embora gritassem: “Eu vou pegar vocês! Eu vou pegar vocês!”, eles não conseguiam alcançá-los.

O Senhor Nityananda disse: “Se sobrevivermos a isso, seremos certamente bons vaishnavas”. Haridasa disse: “Ó meu Senhor, por que Você fala? Por causa de Suas idéias, agora estamos prestes a ter uma morte brutal. Porque Você considerou que seria uma boa idéia instruir esses bêbados sobre o Senhor Krishna, nossas vidas estão prestes a ser findadas”. Falando dessa maneira, o Senhor Nityananda ria e Se divertia, enquanto que os dois vadios os perseguiam e lhes atiravam insultos e desaforos. Os dois bêbados eram gordos e desajeitados; embora não pudessem correr muito rápido, corriam tão rápido quanto podiam. “Ei, irmãos!”, disseram os dois ladrões. “Por que vocês estão correndo? Por que fogem de Jagai e Madhai? Vocês não entendem a verdadeira natureza de Jagai e Madhai; vocês nos julgaram erroneamente”. Tais palavras apenas incentivaram Nityananda e Haridasa a continuarem correndo. “Krishna! Salve-nos! Krishna! Salve-nos! Govinda!”, eles gritavam com medo. Haridasa disse a Nityananda: “O Senhor Krishna me salvou algum tempo atrás das mãos cruéis dos algozes muçulmanos, hoje, todavia, em virtude das idéias de um encrenqueiro de natureza inquieta que me acompanha, terei de me deparar com o fim de minha vida”. Sri Nityananda respondeu: “Eu não sou encrenqueiro. Olhe em seu coração e você verá que o seu mestre sim é um encrenqueiro. Conquanto seja um brahmana, seu mestre dá ordens como se fosse um rei. É por causa das ordens dEle que estávamos indo de casa em casa falando aquilo que falamos. Eu jamais ouvi alguém dar as ordens que Ele dá. ‘Vá até os ladrões e pecadores’. Ninguém diz isso. Se não seguirmos Suas ordens, tudo estará acabado. Se as seguirmos, tudo também estará acabado. Uma vez que você pensa que seu mestre não tem culpa, ambos deveríamos dizer: ‘Eu sou culpado’.”.

Enquanto os dois fatigados ladrões corriam atrás deles, os devotos jocosamente discutiam dessa maneira. Assim corriam em direção à casa de Srivasa Thakura. Confusos em consequência da intoxicação do vinho, os dois ladrões tropeçavam enquanto desvairadamente perseguiam os devotos. Não sendo mais capazes de ver os dois sannyasis, os dois beberrões pararam. Por fim, os dois começaram a se empurrar e a brigar, causando grande comoção. “Para onde eles foram?”. Desorientados pelo vinho, eles não sabiam. Ao olharem rapidamente para trás para saberem se os dois ladrões ainda estavam a persegui-los, os devotos puderam constatar que não. Tendo parado de correr, os dois devotos se abraçaram. Rindo, eles foram ao encontro do Senhor Chaitanya.

O Senhor Chaitanya Ouve o Passatempo de Sankirtan

Já na casa de Srivasa, Nityananda e Haridasa encontraram o Senhor Chaitanya sentado em meio aos devotos com Seus encantadores olhos de lótus e Seus membros de beleza ímpar. A pulcritude do Senhor encantava até mesmo o Cupido. Nessa assembléia de vaishnavas, o único tópico discutido era a Consciência de Krishna. Como o Senhor de Svetadvipa na companhia de Sanaka e outros sábios, o Senhor Chaitanya, na companhia de Seus devotos, explicava a verdade acerca de Si mesmo. Então, Nityananda e Haridasa aproximaram-se do Senhor para Lhe contarem as atividades do dia. “Um estranho incidente hoje ocorreu”, eles começaram. “Nós nos cruzamos com dois homens singulares. Embora nos tenham dito que nasceram em famílias de brahmanas, eles estavam completamente alcoolizados. Visando o bem deles próprios, nós dissemos a eles: ‘Por favor, cantem o nome do Senhor Krishna’. Mas eles reagiram demonstrando descontentamento e nos perseguiram querendo nos agredir. Por pouco, conseguimos escapar com vida”.

“Quem são esses dois homens?”, o Senhor Chaitanya perguntou. “Qual o nome deles? Se são brahmanas, por que agem dessa forma grosseira?”. Gangadasa e Srivasa, que estavam sentados próximos a Chaitanya Mahaprabhu, descreveram os pecados de Jagai e Madhai. Eles disseram: “Senhor, seus nomes são Jagai e Madhai. Eles nasceram aqui nesta cidade, e ambos são filhos de um piedoso brahmana. Más companhias, entretanto, fizeram com que os dois se degradassem; eles, Senhor, não conhecem nada além de intoxicação. Seus nomes instigam medo no coração das pessoas. Não há ninguém como eles aqui. Além deles dois, ninguém mais rouba casas. É impossível descrever todos os seus pecados. Você, no entanto, tudo vê e tudo sabe, meu Senhor”.

O Senhor Chaitanya disse: “Eu sei. Eu sei. Se esses dois pecadores aparecerem diante de Mim, Eu os reduzirei a pedaços”. “Se Você os reduzir a pedaços”, o Senhor Nityananda disse, “Eu não ficarei aqui. Por que Você está irado com eles? Deixe-Me primeiramente fazê-los cantar o nome de Govinda! Pessoas naturalmente piedosas irão facilmente cantar o nome do Senhor Krishna, mas esses dois conhecem apenas atividades irreligiosas. Se nós os liberarmos e os trouxermos para o serviço devocional, então ficaremos verdadeiramente conhecidos como Patita-pavanas, os salvadores dos caídos. Por Me salvar, Você Se tornou glorioso. Contudo, caso salve esses dois pecadores, Sua glória crescerá de maneira exponencial!”. Sorrindo, o Senhor Chaitanya disse: “No instante em que O viram, todos os dois foram imediatamente liberados. Visto que Você está preocupado com o bem-estar deles, o Senhor Krishna logo Se encarregará de beneficiá-los com toda auspiciosidade”. Ao ouvirem estas palavras saindo da boca do Senhor, os devotos irromperam em uma jubilante exclamação de “Jaya! Jaya!”. Todos estavam convencidos de que os pecadores já estavam salvos.

A Liberação de Jagai

Em seu hábito de deambular de um lugar a outro, por arranjo divino, os dois bêbados chegaram ao trecho do Ganges no qual Se banhava o Senhor Chaitanya. Ali, seguiam com sua ocupação de aterrorizar as pessoas. Famosos e importantes, ricos ou pobres – todos sentiam o medo nascer em seus corações. À noite, ninguém se aventurava ir ao Ganges. Se fossem, iam em grupos de dez ou vinte. Durante a noite, os dois beberrões ficavam próximos à casa do Senhor Chaitanya. Ouvindo o Senhor cantar, eles ficavam acordados a noite toda. Ao longo da noite, quando ouviam o kirtana do Senhor com o acompanhamento de karatalas e mrdangas, os dois bêbados dançavam alegremente. Mesmo distantes, eles podiam ouvir o kirtana. Ao som transcendental, eles dançavam e então bebiam mais vinho. Ouvindo o kirtana, eles cantavam, sentavam-se, ficavam de pé, dançavam. Afogados na intoxicação do vinho, eles não sabiam nem onde estavam nem quem eles mesmos eram. Ao se depararem acidentalmente com o Senhor, eles diziam: “Nimai Pandita! Cante as belas canções da deusa Durga! Você canta muito bem! Nós iremos visitá-lO e levaremos a parafernália para o kirtana de Durga”. Vendo os dois ladrões, o Senhor Chaitanya mantinha distância. Outros, ao verem os dois, tomavam uma rota diferente.

Um dia, enquanto andava pela cidade, o Senhor Nityananda foi parado pelos dois bêbados. “Quem? Quem?”, Jagai e Madhai perguntaram aos gritos. “Estou indo para a casa do Senhor”, respondeu Nityananda. Embriagados, eles perguntaram: “Qual é o Seu nome?”. Nityananda respondeu: “Meu nome é Avadhuta”. O tempestuoso Senhor Nityananda, perdido em Seu humor de garotinho, conversou com os dois bêbados como se em uma brincadeira. Ele já havia decidido em Sua mente que libertaria os dois, daí Ele ter premeditado Se encontrar com eles passando por aquele lugar naquele horário. Quando ouviu o nome “Avadhuta”, Madhai pegou um pote de barro e raivosamente o quebrou contra a cabeça do Senhor Nityananda. Quando Nityananda foi atingido pelo pote que antes trazia vinho, sangue escorreu por Sua face. Nityananda meditava silenciosamente no Senhor Krishna. Ao ver ensanguentada a cabeça do Senhor, Jagai ficou compassivo. Quando Madhai posicionou-se para golpear novamente o Senhor, Jagai o censurou: “Por que você age dessa maneira cruel e impiedosa? Por que golpear esse estrangeiro? Não O golpeie novamente. Que benefício lhe traria machucar um sannyasi avadhuta?”.

As pessoas correram desesperadamente até o Senhor Chaitanya para Lhe contarem o que havia acontecido. Acompanhado por muitos devotos, Chaitanya Mahaprabhu imediatamente foi até onde estava Nityananda. Ainda com os dois bêbados Ele Se encontrava. Embora o sangue de Sua cabeça tivesse escorrido por todo o Seu corpo, Nityananda sorria. Ao ver Seu amado Nityananda coberto de sangue, o Senhor Chaitanya ficou imensamente encolerizado. Esquecido do mundo externo, Ele chamou por Seu disco devastador. “Cakra! Cakra! Cakra!”, Ele exclamou repetidamente. Imediatamente se fez presente Sua Sudarsana-cakra – brilhando assustadoramente diante dos olhos de Jagai e Madhai. Os devotos pressentiram uma grande calamidade por vir, mas o Senhor Nityananda rapidamente Se aproximou de Sri Chaitanya e Lhe suplicou: “Senhor, embora Madhai quisesse Me acertar, Jagai o deteve. É unicamente devido ao Meu mau karma passado que sangrei um pouco, mas Eu não estou infeliz. Senhor, por favor, dê os corpos destes dois homens para Mim. Eu não experiencio nenhuma dor; por favor, fique calmo”.

Assim que ouviu as palavras “Jagai o deteve”, um radiante Senhor Chaitanya abraçou Jagai. “Que o Senhor Krishna seja misericordioso com você”, Ele disse a Jagai. “Como você protegeu Nityananda, agora você Me tem como sua propriedade. Você pode pedir-Me qualquer coisa que deseje seu coração. De hoje em diante, você está firmemente situado em uma vida de serviço devocional puro, na qual experimentará amor por Krishna”. Em apreciação à bênção do Senhor a Jagai, todos os devotos gritaram tumultuosamente “Jaya! Jaya!” e “Hari! Hari!”. Em simultaneidade com os dizeres do Senhor Chaitanya “você está firmemente situado em uma vida de serviço devocional puro”, Jagai desfaleceu subjugado pelo intenso êxtase amoroso. O Senhor Chaitanya disse: “Jagai, levante-se e olhe para Mim. Eu realmente o presenteei com a dádiva do amor e da devoção puros ao Supremo”. Jagai então viu o Senhor Chaitanya manifestar Sua forma de quatro braços, na qual portava búzio, cakra, maça e lótus. Vendo tal manifestação, Jagai novamente desmaiou. Com Jagai caído ao chão, Chaitanya Mahaprabhu acomodou Seu pé sobre o peito dele. Jagai pôde entender o grande tesouro que são os pés do Senhor, tesouro este que é a própria vida de Laksmidevi – um tesouro inestimável. Agarrado aos pés de lótus do Senhor, Jagai chorou como uma criança. Assim desfruta eternamente o Senhor de passatempos extraordinários.

A Liberação de Madhai

Uma única vida residia nos dois corpos de Jagai e Madhai. A mesma pureza e o mesmo pecado residia em ambos. Quando o Senhor demonstrou misericórdia para com Jagai, o coração de Madhai imediatamente se purificou. Negligenciando a presença do Senhor Nityananda, Madhai apressou-se em cair como uma vara diante de Sri Chaitanya, agarrando então Seus pés de lótus. Ele disse: “Senhor, Jagai e eu cometemos ambos os mesmos pecados. Assim sendo, Senhor, por que Você não é igualmente misericordioso para com nós dois? Por favor, seja misericordioso comigo. Eu cantarei Seu nome, pois, além de Você, não há ninguém que possa me libertar”. O Senhor Chaitanya respondeu: “Porque você fez com que o corpo de Nityananda sangrasse, Eu não irei proteger você”... (continua)


Tradução de Bhagavan dasa (DvS), revisão de Naveen Krishna dasa (HdG), Prana-vallabha devi dasi (DvS) e Prema Vardhana devi dasi (DvS)