Dedicado a Sua Divina Graça A.C. Bhaktivedenta Swami Prabhupada e Gurudeva Srila Dhanvantari Swami

Dedicado a Sua Divina Graça A.C. Bhaktivedenta Swami Prabhupada e Gurudeva Srila Dhanvantari Swami
Jagad Guru Srila Prabhupada

quinta-feira, 25 de outubro de 2007

As Uvas Verdes e a Videira de Conhecimento Védico - The Sour Grapes and the Vine of Vedic Knowledge



Artigo originalmente publicado em Back to Godhead [Volta ao Supremo] – Revista fundada em 1944 por Srila Prabhupada
As Uvas Verdes e a Videira de Conhecimento Védico
The Sour Grapes and the Vine of Vedic Knowledge

Por Satyaraja Dasa


“aaaaaaauu!”
Meu dentista, provavelmente, esperava por alguma novidade interessante, ou pelo menos aquelas conversas sociais e amigáveis. Afinal, ele não me via já há algum tempo. Mas eu estava ali para fazer logo o que eu tinha de fazer, e ele também. Sem tempo para conversa mole.
“Vamos ver”, disse ele olhando para dentro de minha boca como se procurasse por ouro. “Você precisa de algumas pequenas obturações. Hmm. Um canal, com certeza, e definitivamente uma ponte bem aqui atrás”.
Foi precisamente quando ele cutucou dizendo bem aqui atrás que deixei escapar o “aauu”. Não deu para segurar.
“Pelo amor de Deus”, eu comecei. “Fico deprimido só de pensar em todos esses tratamentos – isso vai custar muito caro, e provavelmente ainda vai doer”.
“Eu não estou dizendo isso para deprimir você”, ele disse balançando a cabeça. “Deprimir você não é minha motivação. Estes são os fatos: seus dentes precisam de atenção, e precisam agora”.
Isso remeteu minha mente a uma conversa que tive no dia anterior no Festival de Domingo do templo Hare Krsna do Brooklyn. Eu estava explicando alguns pontos básicos da filosofia da consciência de Krsna para uma nova visitante, dizendo a ela que este mundo é um lugar de misérias, onde acontecem repetidos nascimentos e mortes. Eu a lembrei que todos nós temos de passar por nascimento, morte, velhice e doenças, e que também tínhamos todos nós que sofrer três classes de misérias: aquelas causadas pelos nossos próprios corpo e mente, aquelas causadas pelos corpos e mentes de outros, e aquelas causadas pelas calamidades naturais.
“Por que você é tão negativo?” ela perguntou.
Um tanto quanto surpreso pela reação dela, eu expliquei que a filosofia negativa, na base da Consciência de Krsna, era apenas um ponto de partida. Tendo isto como base – que o mundo material tende a ser um local desagradável – a consciência de Krsna vem explicar como a vida pode ser verdadeiramente plena de prazer, não apenas em termos de esperança de um futuro melhor, mas aqui e agora conosco mesmos.
Mas agora, sentado na cadeira do meu dentista, eu parecia muito com aquela jovem visitante do templo. Meu dentista estava apenas me dando os fatos, explicando o estado deplorável da minha boca. Todavia, eu achei que era necessário me rebelar e dizer que ele estava sendo negativo demais. De forma similar, quando eu mencionei a mais óbvia verdade sobre a vida em um mundo material cada vez mais degradado, minha nova amiga retalhou imediatamente, como se eu estivesse deturpando os fatos apenas para deprimi-la.
Otimismo, Pessimismo e Realismo
As pessoas, de maneira geral, caem em uma das duas categorias: otimistas ou pessimistas. Elas vêem a vida como sendo basicamente uma experiência de felicidade ou de infelicidade. Os otimistas vêem o copo como estando meio cheio, enquanto os pessimistas o vêem como estando meio vazio. Esses dois tipos de pessoas vêem o mesmo fenômeno de maneiras diferentes. Onde se poderia categorizar os devotos? Seriam eles pessimistas?
Não, eles não são. É verdade que eles estão cientes das misérias existentes no mundo material, mas isto é chamado de conhecimento no modo da bondade. O conhecimento no modo da ignorância, em contraste, é marcado pela dificuldade de perceber o óbvio – cegueira à dor e ao sofrimento que são componentes irrevogáveis do mundo material. Em outras palavras, a Consciência de Krsna tem muito a dizer sobre o lado obscuro desta vida, sobre os perigos de se estar preso em um corpo temporário. Assim, em primeira instância, a Consciência de Krsna pode parecer pessimista. Mas uma observação mais profunda revela que ela transcende completamente a dualidade entre otimismo e pessimismo. Sendo assim, eu chamaria isto de “realismo” ou, ainda melhor, de “realismo espiritual”. O realismo transcendental é equilibrado. Isto acontece porque ele não é produto das ordinárias respostas das almas condicionadas, positivo ou negativo, mas, ao contrário, é uma consciência espiritual transmitida a nós pelos santos e sábios do passado. A Consciência de Krsna é como uma pedra preciosa originalmente revelada pelo próprio Senhor Supremo, e que então descendeu através da sucessão discipular de almas auto-realizadas para ajudar às almas condicionadas a alcançarem a realidade espiritual última.
O Pessimismo e a Tradição Filosófica Ocidental
Em linguagem popular, o termo pessimista se aplica às pessoas que habitualmente vêem a vida de forma melancólica, que vêem experiências dolorosas como que quase desejáveis – ao menos no sentido de que não saberiam como viver de outra maneira. Sofrer é algo familiar para tais pessoas. Adicionalmente, algumas dessas pessoas apreciam de alguma forma o prazer e o lado positivo da vida. Assim, os pessimistas às vezes querem sim felicidade na normalidade – no sentido positivo da palavra – mas eles têm dúvidas sobre a possibilidade de obterem isso. Esses são os dois tipos clássicos de pessimismo.
Em uma abordagem filosófica, o Pessimismo se referiria a presença do mal no mundo, ao tormento que sempre viria anexo às limitações materiais. As pessoas amadas ou morrem ou nos deixam de outra maneira, situações as quais nos apegamos mudam subitamente; ansiedades básicas encontram sempre um espaço em nossas vidas, especialmente no buraco negro de nossa mortalidade – há causas para sofrermos tanto no nível mais grosseiro até os sutis.
No ocidente, o filósofo Leibniz ensinou que a dor é parte integrante de uma existência temporária e finita. Por exemplo, ele diz que não queremos presenciar o fim do prazer, do amor ou da vida, mas eles chegam a um fim de qualquer maneira. O princípio do qual a dor e o mal nascem – a qualidade de todas as coisas materiais serem temporárias – é, assim, visto como parte essencial da natureza. Esta idéia é igualmente clara no pensamento Budista, onde as Quatro Nobres Verdades categorizam o sofrimento de diversas maneiras juntamente com um coerente sistema para a cessação do sofrimento. E isso também é ensinado no Bhagavad-gita, a escritura na qual a consciência de Krsna se apóia.
Arthur Schopenhauer é considerado um dos pais do Pessimismo enquanto escola filosófica. Suas palavras, ao menos no que se refere ao sofrimento, são um eco da verdade encontrada na literatura Védica. De forma definitiva, Schopenhauer afirma que “a vida toda é baseada em sofrimento”. Ele explica isso lembrando que tudo o que vive tem desejos, vontades e necessidades. “A vida deseja”, ele diz, “e porque a maior parte de seus desejos não são realizados, a vida acontece basicamente em um estado de privação e de empenhos fracassados”.
Sua análise me fez lembrar de algo que eu disse ao meu dentista: Todo empenho material para se obter a felicidade pode ser colocado dentro de grandes categorias, e todos eles resultam em miséria: (1) Você se esforça por obter felicidade e não a consegue. Você está em uma condição miserável por motivos óbvios. (2) Você se esforça por obter felicidade e consegue, mas tal felicidade não atende às suas expectativas. Mais uma vez você se encontra em uma situação miserável. (3) Você se esforça por obter felicidade e consegue, e essa felicidade realmente atende às suas expectativas. Mas você a perde depois de algum tempo. Existe alguma forma de felicidade material que não se encaixe em uma dessas três categorias?
“E mesmo isso que chamamos de ‘felicidade’”, diz Schopenhauer, “é, na verdade, apenas uma cessão temporária de algum sofrimento em particular”.
Toda satisfação, ou o que é comumente chamado de felicidade, é de fato algo essencialmente negativo apenas, e nunca positivo. Não há uma gratificação que venha até nós originalmente e por si só, mas é sempre a satisfação de uma demanda. Em termos de desejo, ou seja, querer, é a condição prévia necessária para qualquer prazer; mas com a satisfação deste, o desejo cessa, e em seguida o prazer também cessa. Portanto, a satisfação ou gratificação não é nada senão o alívio de alguma dor, de algum querer.
A tradição Védica profere essa mesma idéia. Srila Prabhupada por diversas vezes se referiu à felicidade no mundo material como mera “cessão de alguma miséria”. Ele costumava mencionar a analogia da punição por repetidos afogamento. Para punir os infratores das leis, oficiais da corte costumavam amarrar os criminosos em uma espécie de gangorra sobre um poço, descendo eles para dentro d’água e depois, repetidamente, tirando eles de dentro d’água. Desesperado por um pouco de ar, o réu convicto desfrutaria do ato de respirar como se isso fosse o maior de todos os prazeres. Da mesma forma, Prabhupada nos ensina que, porque o mundo material é destituído de qualquer gozo real – de qualquer prazer substancial – as minúsculas sensações provenientes do corpo e da mente parecem muito atrativas, como um pouco de ar é para uma pessoa que se afoga.
Os Devotos São Pessimistas Então?
Srila Prabhupada deixa claro em seus livros que o sofrimento é parte integrante da existência material: “Dentre tantos seres humanos que estão sofrendo, poucos são os que realmente perguntam sobre sua posição, sobre quem são, por que estão nesta posição ingrata e assim por diante. Se a pessoa não despertar para esta plataforma na qual ela quer saber o porquê de seu sofrimento, se não se der conta de que não quer sofrer, mas sim encontrar uma solução para todo este sofrimento, ela não deve então ser considerada um ser humano perfeito. A raça humana começa quando este tipo de indagação desperta na mente”. (Bhagavad-gita Como Ele É, Introdução)
A última frase da citação acima revela algo sobre o porquê de se sofrer no mundo material. O sofrimento serve para impelir o ser humano a inquirir acerca da consciência de Deus. Após vidas e vidas em sofrimento, o sábio começa a se perguntar, “Qual a razão da vida? Por que estou aqui? Por que tenho de sofrer?”. Essas perguntas diferenciam os homens dos animais.
Nos Livros de Srila Prabhupada, ele frequentemente revela uma espécie de hierarquia de consciências. No nível mais primário, ele diz, a pessoa acredita que o mundo é seguro, que o prazer interminável existe aqui, e que se pode viver feliz para sempre. Mas ele imediatamente aponta que uma vida baseada em tal pensamento é semelhante à vida animal, na qual comer, dormir, acasalar e se defender são as atividades prioritárias, e a pessoa tem pouco tempo para buscar a consciência de Deus. Os seres humanos, ele nos diz, devem ir além deste básico, desta mentalidade animalesca. E se eles conseguem algum avanço, mesmo que pequeno, ele diz, eles adotam uma espécie de visão pessimista da vida, atestando a limitação da felicidade material, sua ausência de profundidade e sua natureza temporária.
De forma muito significante, todavia – e este é o ponto principal – Prabhupada também fala sobre um nível de existência superior, no qual a pessoas dá adeus ao pessimismo e se situa em consciência de Krsna. Desta perspectiva, a vida se torna repleta de significado, repleta de propósito, repleta de bem-aventurança. Essa nova vida começa quando servimos Krsna neste mundo material, e continua mesmo depois que alcançamos Seu reino supremo.
Nada de Otimismo Ingênuo
No final das contas, os devotos acreditam mais na esperança do que no desespero, acreditam mais na tolerância do que no medo. Eles acreditam no amor, e não no ódio; na compaixão, não no egoísmo; na beleza, não na fealdade; no conhecimento realizado, não na fé cega ou na irracionalidade. Eles acreditam no trabalho árduo para o verdadeiro crescimento da humanidade, e dedicam seu tempo e vida para ajudar a todas as pessoas. Essas não são as qualidades do pessimista.
Mas os devotos também não são otimistas ingênuos. Eles não acreditam que todos os seres humanos irão, necessariamente, ter para si metas elevadas. A consciência de Krsna é uma filosofia pragmática – os homens não são obrigatoriamente bons ou ruins, mas eles certamente têm a capacidade para ambos. Por esta razão, Srila Prabhupada estabeleceu sua instituição (ISKCON) para encorajar o bem último e maior e, ao mesmo tempo, para desencorajar não só o mal mais grosseiro e aparente, mas também a pseudo-bondade do materialismo.
Neste ponto, muitos talvez olhem para os devotos um tanto desconfiados, perguntando-se por que eles não são mais envolvidos em trabalhos sociais e atividades altruístas. A verdade é que os devotos fazem tais atividades, mas preferem fazê-las de forma espiritualizada, levando-as para o próximo nível ao usá-las a serviço de Krsna.
Os devotos, por exemplo, acham importante distribuir alimento, mas eles insistem em distribuir Krsna prasadam, suntuosas preparações vegetarianas que foram primeiramente oferecidas a Krsna com amor. Distribuição de prasadam é a perfeição da distribuição de alimentos, pois alimenta tanto material quanto espiritualmente. Os devotos têm predileção por esta distribuição de prasadam porque acreditam poderem, assim, ajudar as pessoas a transcenderem ao mal e à dor.
Assim surge a questão: Como podemos transcender o mal e o sofrimento humano? Muitas religiões tradicionais nos ensinam que podemos transcender essas aflições apenas na vida após a morte, onde um bondoso Deus administra Seu reino paradisíaco. A consciência de Krsna, todavia, rejeita a idéia de que temos de esperar. Sim, claro, aqueles que são conscientes de Krsna têm assegurado um local após a morte ao lado de Krsna no mundo espiritual. Mas essa não é a principal preocupação deles. Ao contrário, Prabhupada ensinou aos devotos que eles deveriam lutar contra o mal e o sofrimento humano aqui e agora. Uma vez que somos responsáveis por aquilo que está errado em nossas vidas, também somos responsáveis por fazer as coisas certas. A consciência de Krsna nos ensina que podemos, sim, fazer as coisas certas, mas com a condição de que nos rendamos a Deus, com um coração cheio de amor e devoção. Os devotos tentam fazer isso em suas vidas pessoais, e ensinam para os outros o mesmo princípio.
Prabhupada conclui:
Conhecimento significa entender como o supremo controlador está controlando. Pessoas que desafiam a religião e que negam a existência de um controlador supremo são como a raposa que continua pulando e pulando, tentando alcançar as uvas de uma videira enorme. Quando não consegue alcançar as uvas, ela diz para si mesma, “Ah! Para que tentar pegá-las? Elas estão verdes de qualquer maneira”. Pessoas que dizem que não precisamos entender Deus estão se entregando à filosofia das uvas verdes.
Prabhupada aqui aborda o “devoto como pessimista” de seu prisma. Ele vê o materialista como pessimista – por rejeitar Deus com sua filosofia do tipo “uvas verdes”. De qualquer forma, da perspectiva Védica, o devoto tem a maior expectativa para com a humanidade – ocupá-la a serviço de Krsna – enquanto que os materialistas são desesperançosos, tendo abandonado a busca acerca da compreensão de Deus. E nesta ausência de esperança, eles podem às vezes ver os devotos como negativos.
Mas os devotos valorizam este mundo mais do que ninguém, porque o vêem em relação com Deus. Algumas pessoas vão gostar dessa visão: “Certo. É importante ver Deus em Sua criação. Mas por que, então, vocês devotos tendem a enfatizar o criador ao invés da criação?”. A razão é simples: os devotos sabem que focar na criação pode distrair a pessoa em relação ao conhecimento do criador. Por isto os devotos colocam foco no Criador: para evitar a armadilha de se perderem. Até que a pessoas aprenda a se focar em Deus, a relação entre Ele e Sua criação continuará algo abstrato. Isto não se trata de uvas verdes; isto é apenas um fato da vida.


Tradução por Bhagavan dasa (DvS)

A Verdadeira Erudição


A Verdadeira Erudição


Por Bir Krishna Prabhu (DVS), Facilitador do Instituto Bhaktivedanta para Auto-Realização – IBAR. Uberaba, MG. 19/10/2007.


Eu tenho tentado por vezes ouvir o Bhagavad-gita como se eu tivesse ali presente no cenário de Kuruksetra, espreitando a memorável conversa entre as duas grandes almas, Krishna e Arjuna. É dito que devemos nos espelhar no humor dos grandes devotos para conseguirmos ter um vislumbre de suas realizações. Pessoalmente, ao adotar esta atitude de ouvir deste modo o Bhagavad-gita, inspirei-me no exemplo de Sanjaya, o narrador do Bhagavad-gita que dirigindo-se a seu amo Dhritarastra, a quem relatava os acontecimentos na frente de batalha em Kuruksetra, diz: “Ó rei, à medida que vou recordando este magnífico e santo dialogo transcorrido entre Krishna e Arjuna, sinto prazer e a cada momento fico emocionado” (Bg. 18.76).

Vejamos, de fato, o que acontece conosco quando somos testemunhos de uma conversa muito edificante? A minha experiência tem me mostrado que me sinto transportado pela atmosfera que cerca este evento e me emociono em diversos pontos altos da conversa. E mesmo dias após ter participado deste momento ímpar a semelhança de Sanjaya, sou ainda capaz de recordar cada palavra de tal conversa e ser de novo mexido intimamente por profundos, sutis e saborosos sentimentos. O Prabhupada-lilamrta, a biografia autorizada do fundador-acharya da Sociedade Internacional para Consciência de Krishna (ISKCON), relata que as conversas de Srila Prabhupada com diversas personalidades formadoras de opinião, em suas caminhadas matinais, eram acompanhando por muitos devotos seniores que se embebiam com os assuntos discutidos naquelas ocasiões e até hoje se rememoram das mesmas em suas aulas nos templos da ISKCON ao redor do mundo. Eu pessoalmente, como tantos outros devotos, tive a feliz oportunidade de ouvir essas memoráveis conversas de Prabhupada por intermédio de seus discípulos íntimos como Hridayananda das Goswami e Jayapataka Swami.

Meu desejo, neste artigo, querido leitor, é compartilhar com você, um dos pontos altos, direi o primeiro, na conversa entre Krishna e Arjuna. Este último ocorre no exato momento em que o Senhor Krishna, a Suprema Personalidade de Deus, após acolher o pedido formal de Arjuna para o discipulado, assume de fato seu papel como mestre espiritual e repreende de modo incisivo o seu mais novo aluno dizendo:

asocyan anvasocas tvam
prajna-vadams ca bhasase
gatasun agatasums ca
nanusocanti panditah
(Bg. 2.11).

“Enquanto falas palavras sábias, estás lamentando aquilo que não precisa te afligir. Os sábios não lamentam nem os vivos nem os mortos”.

Eu que ali estava espreitando a conversa entre os dois ilustres personagens, fui sacudido pela gravidade das palavras do Senhor Krishna, mas ao mesmo tempo numa atitude de muita reverência, acolhi aquela repreenda como dizendo respeito a mim mesmo. Às vezes, quando o mestre espiritual corrige a atitude errônea de um discípulo diante de um outro, em vez, deste ultimo fazer disto mais tarde motivo de chacota, deve ao contrario aproveitar pessoalmente a lição. Portanto, imbuído deste estado de espírito, pus-me a meditar sobre o significado da fala do Senhor Krishna naquele momento. Embora, transportado pela atmosfera da sagrada conversa, os comentários de Srila Prabhupada logo vieram a meu auxilio para clarear-me a mente.

Arjuna, como príncipe guerreiro havia recebido uma educação primorosa em todos os ramos do conhecimento védico, como ética, princípios religiosos, etiqueta, política, etc., e fizera valer, portanto, tal conhecimento em sua argumentação enquanto questionava diante do Senhor Krishna a validade da batalha e inclinava-se a recusar-se a luta para não ter de enfrentar seus próprios entes queridos e correr o risco de perdê-los durante os confrontos. A esse respeito, Srila Prabhupada comenta: “Arjuna não sabia que o conhecimento sobre a matéria, a alma e o Supremo é ainda mais importante do que as praxes religiosas. E porque lhe faltava esse conhecimento, ele não devia tentar fazer-se passar por homem muito instruído. Como de fato não era um homem muito erudito, conseqüentemente ele estava lamentando algo que era indigno de lamentação. O corpo nasce e está destinado a perecer hoje ou amanhã, logo, o corpo não é tão importante como a alma. Aquele que sabe disso é realmente erudito, e qualquer que seja a condição do corpo material, ele não tem motivo para lamentação”. Eis o significado da verdadeira erudição, estar ciente da supremacia do espírito sobre a matéria, e melhor ainda, conhecer nossa posição constitucional enquanto alma como serva eterna do Senhor Krishna, assim ocuparmo-nos ininterruptamente em presta-Lhe serviço com muita devoção e amor.


HARE KRISHNA

Levando a Liberação a Sério - Getting Serious About Liberation


Publicado como um artigo em Back to Godhead [Volta ao Supremo] - Revistafundada por Srila Prabhupada no ano de 1944


Levando a Liberação a Sério - Getting Serious About Liberation


Por Sua Divina Graça A. C. Bhaktivedanta Swami Prabhupada


[Aula proferida em Vrndavana, Índia, em 6 de novembro de 1972]


mumukshavo ghora-rupanhitva bhuta-patin athanarayana-kalah shantabhajanti hy anasuyavah"Aqueles que são sérios quanto à liberação certamente não são invejosos, e elesrespeitam a todos. Mesmo assim eles rejeitam a horrível e repugnante forma dossemideuses e adoram unicamente a forma plenamente bem-aventurada do SenhorVisnu e Suas porções plenárias". - Srimad-bhagavatam 1.2.26A primeira palavra, mumukshavah, significa "desejando ser liberado". É muitodifícil encontrar essa classe de homens, os mumukshavah. As pessoas não sabem osignificado de mumukshavah. Elas não sabem o que é a liberação. Mesmo osassim-chamados cientistas e filósofos da era moderna não sabem o significado deliberação, moksha. E mesmo assim eles são os formadores de opinião da massa e aelite da educação. Eles não sabem o objetivo da vida, a que a vida humana sedestina.Uma vez, no ano de 1950 ou '51, eu fui para Jhansi, e o amigo em cuja casa euestava ficando era um líder. Havia um encontro pelo dia do desaparecimento deGandhi, e eu fui convidado a palestrar. Naquela época eu não era sannyasi. Eufui convidado a palestrar sobre o tema não-violência. Então eu expliquei que sevocê tem algum direito e alguém, através de algum tipo de força, impede você deestar dentro de seu direito, isto é violência. Eu tenho o direito de ter algoou de entrar em algum lugar, e alguém me impede - "Você não pode entrar" - issoé violência, e é crime.Nossa terra natal é Bharatavarsha [Índia]. Nascer em Bharatavarsha não é algocomum. Vejam quantos homens estão automaticamente circuambulando este templopor respeito. Mesmo um homem comum o fará. Se você fizer um estudo, você veráque, por natureza, as pessoas em Bharatavarsha são conscientes de Deus. Mesmoum homem muito pobre está satisfeito em consciência de Deus. Ele não se importade ser miserável materialmente. Ele está satisfeito: "Krsna me deu estaposição". Ele não tem interesse em saber, nem se pergunta "porque eu soumaterialmente miserável?". Ao contrário, ele pensa, "agora eu estou recebendoum pouco de comida pela misericórdia de Krsna".Há algum tempo atrás, não muito, cerca de duzentos ou trezentos anos, havia umgrande zamindar em Krsnanagara chamado Raja Krsnacandra. Ele se aproximou de umerudito, um brahmana pandita, que havia aceitado voluntariamente viver empobreza, e perguntou a ele: "Panditji, será que eu posso lhe ajudar de algumamaneira?".O pandita tranquilamente respondeu, "Eu não preciso de nenhuma ajuda sua"."Mas eu vejo que o senhor é muito miserável materialmente"."Não, eu não sou. Meus estudantes me trazem arroz, e minha esposa o cozinhaenquanto eu colho algumas folhas de tamarindo. E isto é muito bom. Eu nãopreciso de nenhuma ajuda material".Esta é a herança da Índia. Canakya Pandita foi o maior erudito e maiorpolítico. Ele foi o primeiro ministro do Imperador Candragupta Maharaja.Canakya Puri em Nova Delhi recebe esse nome por causa de Canakya Pandita. Elevivia em um pequeno chalé, e não aceitava nenhum salário. E tão logo MaharajaCandragupta requisitou explicações acerca de uma instrução que Canakya havialhe dado, Canakya abandonou o cargo de primeiro ministro. Tal desapego é opadrão das pessoas nascidas na Índia. Peguemos Vyasadeva, por exemplo. Quempode ser mais erudito que Vyasadeva? Sua última contribuição foi oSrimad-bhagavatam, e cada palavra desta obra, se você estudá-la por centenas deanos, você continuará tendo algo novo para aprender. Cada palavra. Umintelectual excepcional, e vivia em um pequeno chalé.Essa é a verdadeira cultura da Índia. Então eu expliquei na reunião emKrsnanagara, "Depois de muitos e muitos nascimentos, a pessoa tem aoportunidade de nascer nesta terra sagrada de Bharatavarsha. Infelizmente,vocês líderes estão, pelo uso de seu poder, tornando as pessoas materialistas.Elas receberam a oportunidade de terem acesso à contribuição de grandes sábios,rishis, a oportunidade de estudarem suas escrituras e se tornarem seres humanosbem sucedidos, mas vocês estão privando as pessoas dessa oportunidade ejogando-as no meio de vida materialista. Isto é violência. O que vocês entendempor não-violência? Isto é violência".Há cerca de vinte anos atrás eu estava pensando sobre isso. Na verdade, pessoasestão sendo mortas não apenas na Índia, mas no mundo todo por esses líderescegos. Eles não sabem como conduzir as pessoas, como fazê-las felizes, comofazê-las bem sucedidas na forma de vida humana.Entenda Radha-KrsnaNarottama Dasa Thakura cantou:hari hari biphale janama gonainumanushya janama paiyaradha-krishna na bhajiyajaniya shuniya bisha khainu"Meu querido Senhor Krsna, eu simplesmente desperdicei meu tempo". Semconsciência de Krsna, nós estamos simplesmente jogando nosso tempo fora. Aforma de vida humana nos dá grandes oportunidades, mas nossa atenção éequivocadamente direcionada simplesmente para os atos de comer, dormir,acasalar-se e defender-se. E nosso verdadeiro interesse é deixado de lado.Narottama Dasa Thakura resume bem isso. Hari hari biphale janama gonainu:"minha vida passou em vão".A forma de vida humana é especificamente destinada a entender Krsna,Radha-Krsna. Se não Radha-Krsna, pelo menos o Krsna da batalha de Kuruksetra. OSr. M. C. Chatterji era um grande amigo meu. Ele disse, "Swamiji, eu quero oKrsna do campo de batalha de Kuruksetra, não o de Vrndavana". Tudo bem. Pelomenos aceite o Krsna do campo de batalha de Kuruksetra. Mas aceite Krsna. Sevocê não é afortunado o suficiente para entender Radha-Krsna, ao menos tenteentender Arjuna-Krsna.O mundo inteiro está sofrendo essa violência. Falo isso para os homenspensativos. As pessoas são mortas sem a consciência de Krsna. Elas recebem estaoportunidade, a forma humana de vida, e elas têm de ser educadas de forma queentendam Krsna. Entendendo Krsna, elas podem se tornar liberadas. Como éafirmado aqui: mumukshavah. Mumukshavah significa aqueles que desejam aliberação. Mas os líderes e formadores de opinião não sabem o que é liberação,o que é transmigração da alma, o que é a alma - nada. São um bando de patifes,e mesmo assim estão liderando toda a população. Eles não sabem o que éliberação. A teoria de Darwin, o conceito corpóreo de vida, antropologia - tudoisso continua na universidade. Uma falsa teoria, sem nenhum significado.Aqui é dito mumukshavah, desejo de liberação. Mas as pessoas definitivamentenão sabem o que é liberação. Elas estão pensando em liberação em termospolíticos. Nós indianos nos tornamos livres do governo inglês. Que tipo deliberação nós conseguimos? Durante o regime inglês, nós éramos livres para noslocomovermos, livres para gastar o dinheiro deles. Agora você é tão livre quenão pode se locomover, você não pode gastar seu dinheiro. É essa a liberaçãoque temos agora. Formalmente não há nenhuma restrição quanto a sair do país.Mas, como um sannyasi, eu tive muita dificuldade para obter permissão dogoverno para sair do país.Grandes dificuldades eu tive para sair deste país! E porque eu - de uma maneiraou de outra, pela misericórdia de Krsna - saí do país, eu pude espalhar essemovimento da consciência de Krsna pelo mundo. De outra forma, isto seriaimpossível. Eu quis começar esse movimento na Índia, mas eu não fui de formaalguma encorajado.Eu me aproximei de vários amigos: "Você tem quatro filhos. Caridosamente me dêum de seus filhos. Eu quero fazer dele um brahmana"."Mas Svamiji, o que ele fará tornando-se um brahmana? Nós temos quesobreviver".Percebem? As pessoas se esqueceram qual é o objetivo da vida, qual é a razão davida. Caitanya Mahaprabhu disse:bharata-bhumite haila manushya-janma yarajanma sarthaka kari' kara para-upakara"Todos que nasceram na terra de Bharatavarsha devem tornar suas vidas bemsucedidas". [Chaitanya-charitamrita, Adi-lila 9.41] Porque aqui nós realmentetemos a oportunidade de sermos liberados. Em Bharatavarsha nós temosinformações acerca da liberação. Não há tal informação em nenhum outro país. Aassim-chamada liberação deles significa liberdade política. Lutar entre si -isto não é liberação. Liberação significa sair do ciclo de nascimentos emortes. Isto é liberação. Mas as pessoas não fazem idéia do que seja liberação,ou para onde vão após liberadas. Parece haver um bloqueio para se aceitar talconhecimento.Por isso é muito difícil para as pessoas entenderem a afirmação doSrimad-Bhagavatam, como neste verso: mumukshavo ghora-rupan hitva bhuta-patinatha. As pessoas não entendem. Elas estão tão desencaminhadas, tiveram umaformação tão ruim, que não conseguem entender.Mas a terra de Bharatavarsha tem por objetivo fornecer a liberação. Em outrasterras, as pessoas nascem e não têm nenhuma informação sobre liberação. Aqui,nesta terra, Bharatavarsha, existe a idéia de liberação, mukti. Nós deveríamoster interesse pela liberação. Nossa condição dentro desta prisão material é ade que estamos transmigrando de um corpo para outro, sempre tentando aprimorarnossa condição material. Algumas vezes nós vamos para planetas superiores, ealgumas vezes nós descemos.O Escuro Mundo Material E assim continuamos a levar a mesma vida. Mas a forma de vida humana tem porobjetivo sair da escuridão do mundo material. Tamasi ma jyotir gama. Esta é asugestão védica: "Não permaneça na escuridão". Este mundo é escuro, comoexperimentamos durante a noite, antes do sol nascer. E ele é escuro devido àignorância. Nós não sabemos o objetivo da vida. Por isso o mundo inteiro estána escuridão. E a sugestão dos vedas é "Não permaneça na escuridão. Venha paraa luz". Mas essa educação - de como sair da escuridão da ignorância e daescuridão deste mundo material - está escassa.Aqui é mencionado: narayana-kalah shanta bhajanti hy anasuyavah. Asuyasignifica invejoso. Quando apresentamos Krsna, especialmente na Índia, aspessoas O invejam às vezes. Mas fora da Índia, as pessoas reagiram de formadiferente. Eu apresentei perante elas que "Krsna é a Suprema Personalidade deDeus. Você está procurando por Deus. Aqui está Deus. Aqui está o nome de Deus,aqui está o endereço de Deus, aqui estão as atividades de Deus. Tente entenderDeus. Por que vocês estão especulando?", e eles aceitaram. Eles não sãoasuyana. Eles não são invejosos.Aqui, se eu apresento Krsna, a pessoa talvez diga, "Por que não Kali? Ah, Kalié tão viva. Ela tem uma língua enorme. Ela carrega uma espada em sua mão,cortando cabeças. Isto é tão legal. E nós podemos comer cabras". Percebem?Kali-puja é mesmo para comedores de carne. Agora é a temporada de Kali-puja.Kali-puja está aí porque os shastras Védicos, as escrituras, são tão bemescritos, que todos, do mais baixo tolo ao homem mais inteligente, sãoelevados. Esse é o propósito. Todas as categorias de homens estão ali. Algunssão influenciados pelo modo da bondade; alguns são influenciados pelo modo dapaixão; alguns são influenciados pelo modo da ignorância. E os Vedas sedestinam a todos os seres humanos.Há diferentes tipos de seres humanos; por tanto há diferentes tipos de shastraspara que todos os tipos de homens sejam atraídos, inclusive os comedores decarne. A entidade viva vem para o mundo material para desfrutar, parasatisfazer os sentidos materiais. Tal desfrute se refere especialmente a comercarne, beber vinho e fazer sexo. Assim os Vedas regulam o assim-chamadodesfrute. "Você quer comer carne? Certo, então sacrifique uma cabra perante adeusa Kali e a adore no amavasya, a noite da lua negra". Há muitas regulaçõesenvolvidas. O verdadeiro objetivo é restringir. Mas se fosse faladodiretamente, "Não coma carne", os comedores de carne iriam se rebelar.Assim, as escrituras Védicas trazem várias prescrições para que diferentessemideuses sejam adorados. De outra forma, não há necessidade de adorá-los.Isto é explicado no Bhagavad-gita (7.20). Kamais tais tair hrita-jnanahprapadyante 'nya-devatah: Aqueles que estão adorando os semideuses se tornaramcegos; eles perderam seus sentidos. Hrita-jnana: O verdadeiro conhecimento éperdido. Assim, eles ficam atrás dos favores de vários semideuses. Eu não estouinventando este ponto. Krsna pessoalmente diz kamais tais tair hrita-jnanahprapadyante 'nya-devatah: não há nenhuma necessidade de se adorar qualquersemideus.Esta é a moral do festival de Govardhana-puja. Nanda Maharaja, o pai de Krsna,estava fazendo os arranjos para a adoração de Indra. Krsna o deteve, e Eleocupou Seu pai na adoração de Govardhana, que é uma representação de Krsna.Este é o significado do Govardhana-puja.Nós conseguimos diferentes tipos de prazeres sensoriais em diferentes corpos.Mas isto não é um bom negócio. Às vezes eu me torno um semideus, e às vezes eume torno uma árvore de eucalipto, de pé por trezentos anos. Por que deveríamosdesperdiçar nosso tempo desta maneira? Fazer esta pergunta é sinal deinteligência. Mas as pessoas não sabem que "desta vez" são americanos. "Eutenho meu arranha-céu e um automóvel e tenho também um excelente saldobancário. Eu sou muito feliz". Eles não se importam. Mas a pessoa não sabe quena próxima vida ela talvez se torne um gato ou um cachorro. Isso eles nãosabem. Este é o perigo.Um Movimento Científico Esta ciência não é ensinada em nenhuma universidade. As pessoas são grandespatifes e tolos. Esta é uma grandiosa ciência - transmigração da alma,imortalidade da alma, como elevar a alma até a mais alta perfeição. Os patifesnão sabem. Nem estão aprendendo isso. Estamos vivendo um momento muitodesafortunado.Há uma grande necessidade, então, de espalhar o movimento da consciência deKrsna para educar de verdade o ser humano para que ele possa alcançar a maiselevada perfeição da vida. Isto é necessário. Não se trata de um sistemareligioso, competindo com alguma outra religião. Nós somos criticados portransformar Cristãos em Hindus. Isto não faz nenhum sentido. Nós não temospreocupações em termos de Hindus, Muçulmanos ou Cristãos. Meus discípulos sãogarotos educados; eles não têm interesse em se tornarem Hindus. Muitas pessoasantes de mim, muitos svamis, foram para o Ocidente para converter Cristãos emHindus. Mas os ocidentais cuspiram em suas caras. Esses svamis não tiveramsucesso porque ficaram falando coisas sem sentido. Por que deveria um Cristãose tornar Hindu, ou um Hindu se tornar Cristão? As pessoas devem saber o que éDeus e qual sua relação com Deus. Este movimento da consciência de Krsna não épara transformar Hindus em Muçulmanos ou Muçulmanos em Hindus ou Cristãos emHindus. Nosso movimento não é tal movimento. Estes jovens rapazes e moçasocidentais entenderam isto claramente. Por isso estão seguindo. Estãoaceitando. Se eu tivesse pregando que o Hinduísmo é melhor que o Cristianismo,eles já teriam me despachado há muito tempo. A consciência de Krsna é umaciência; é uma filosofia.Há uma grande necessidade de educar as pessoas em relação ao objetivo da vida.Esta é a missão de Caitanya Mahaprabhu. Ele estava se dirigindo aos sereshumanos, àqueles que são de fato seres humanos, não a gatos e cachorros. Eledisse, "Estudem a contribuição dos grandes sábios e façam de suas vidas umgrande sucesso. E, então, saiam por aí e preguem esta missão". Essa missãocontinua, agora sob a alcunha de movimento para a consciência de Krsna. Não setrata de um movimento sentimental. É um movimento científico.Assim nós restringimos nossos estudantes da adoração de qualquer semideus.Quando eu comecei esta missão, muitos amigos me sugeriram, "Por que você não achama de 'consciência de Deus'?", mas eu insisti que fosse "consciência deKrsna". De outra forma, as pessoas incluiriam vários deuses. "Aqui está outrodeus, aqui está outro deus, aqui está outro deus, aqui está outro deus, aquiestá outra encarnação, aqui está outra avatar". Tudo conversa fiada. Eu quisdestacar aquele que é de fato Deus. Krishnas tu bhagavan svayam: "Krsna é aSuprema Personalidade de Deus". [Srimad-Bhagavatam 1.3.28]. Ou como é trazidono verso de hoje: narayana-kalah shantah. Deve-se adorar unicamente a Krsna e aSuas expansões plenárias.Tentem entender a nossa missão. Aqui está declarado que devemos aceitar aSuprema Personalidade de Deus. Krsna também diz, sarva-dharman parityajya mamekam sharanam vraja: "Renda-se unicamente a mim. Então você será salvo".[Bhagavad-gita 18.66].Nós não sugerimos: "Adore Kali ou Siva ou qualquer outro - é tudo a mesmacoisa. Yata mata tata patha". Nós não falaríamos tamanho disparate. Nós apenasdizemos: "Aproxime-se de Krsna, e vocês será salvo".


Tradução por Bhagavan dasa (DvS)

Tempo: O Deus que Jamais Pisca Seus Olhos - Time, the Winkless God



Artigo originalmente publicado em Back to Godhead [Volta ao Supremo] – Revista fundada por Sua Divina Graça Srila Prabhupada no ano de 1944


Tempo: O Deus que Jamais Pisca Seus Olhos - Time, the Winkless God
Por Mathuresa Dasa


Tempo é algo um tanto quanto difícil de se definir. Filósofos e teólogos têm tentado por, pelo menos, vinte e cinco séculos. Albert Einstein, em meio a definições mais esotéricas em relação a outros conceitos da Física, definiu tempo como aquilo que o seu relógio de pulso marcava. Santo Agustinho disse que ele sabia o que era o tempo desde que ninguém lhe pedisse para explicá-lo. E com um ar de frustração, em seu livro What, Then, Is Time [sem tradução para o português] – cujo título também faz referência a Santo Agustinho – Eva Brann se lamenta: “Como eu posso não saber exatamente o que é algo que eu digo, reservo, gasto, marco ou desperdiço todos os dias?”.
Se não sabemos o que é o tempo, talvez possamos ao menos colocá-lo em algum lugar, ou melhor, dizer onde ele está, e onde ele não está. Em Uma Breve História do Tempo, o cientista Stephen Hawking propõe que “o conceito de tempo não tem nenhum significado antes do começo do universo”, colocando o tempo, assim, como parte integrante e inseparável do universo. Hawking cita (mais uma vez) Santo Agostinho dizendo que o tempo é propriedade do universo criado por Deus, propriedade esta que não existia antes da criação.
A literatura Védica, que abrange uma enorme gama de assuntos, também trata do tempo. O Srimad-Bhagavatam, em particular, traz relevantes considerações acerca do local e função do tempo dentro da criação do universo. Algumas partes do Bhagavatam confirmam e outras contradizem as afirmações de Hawking, Einstein, Agustinho e outros, enquanto oferece uma abordagem ímpar sobre o assunto.
O Bhagavatam ensina que o Senhor Krsna, em sua forma de Visnu, é responsável pela criação. Embora Brahma e Siva também tenham seus papeis, o poder deles vem do Senhor Visnu. Apenas Ele existe antes da criação, quando a natureza é um atributo sutil de Sua pessoa, e o tempo está em um estado inativo - na forma de um de Seus poderes. Através de seus próprios atributos e poderes, o Senhor Visnu cria o universo, que é, portanto, idêntico a Ele, enquanto que Ele permanece inalterado e plenamente independente. Ele mantém a criação, sem a necessidade de nenhum esforço, por um inimaginável período de tempo, depois a destrói e a absorve para dentro de Si, e em seguida a cria novamente.
Isto acontece repetidas vezes, e, após cada destruição, Visnu fica sozinho. Ou quase isso. Visnu tem uma morada eterna, além da criação e destruição da matéria, onde Seus devotos perfeitos vivem em Sua companhia. Visnu dá a esses devotos corpos divinos e plenamente livres de aflições, decorados com coroas e guirlandas: como o Seu. Eles residem com Ele eternamente, livres do perigo de renascer em um universo temporário. De qualquer forma, o Senhor Visnu, algumas vezes, visita pessoalmente Sua criação, e algumas de Suas vindas como avatara são descritas no Bhagavatam. Esses avataras vêem para salvar o mundo, protegendo os bons e destruindo aqueles de mentalidade perversa, enquanto estabelecem o dharma. O Senhor Visnu desce, portanto, por Seu desejo pessoal, não como as subordinadas almas individuais, que ficam todas sob o controle do karma ao entrarem no universo no começo da criação.
Esse ciclo de criações anda junto com o recorrente tema do tempo circular que é descrito na literatura Védica. As eras de Satya, Treta, Dvapara e Kali se revezam como as estações. As entidades vivas individuais giram pelo ciclo de nascimentos e mortes em diferentes corpos. A criação e a destruição do universo também acontecem repetidamente.
Tempo Como um Fator Instrumental
O Srimad-Bhagavatam narra que quando a criação do universo está sendo iniciada, a natureza se manifesta de Visnu em um estado inerte e abstrato. Ainda sem nenhum elemento, sem ar ou água, nada está acontecendo. Visnu usa Seu poder do tempo para causar uma “comoção” na natureza, e a insemina com uma grande quantidade de entidades vivas individuais, ou almas, ainda sem corpos. Essa inseminação faz a criação continuar. A metáfora de uma gravidez é performática, com as entidades vivas agora no ventre da natureza, e com o tempo como um “fator instigador”, claramente exercendo o papel central de, se ainda não precisamente especificado, misturador dos elementos. O tempo é uma causa original enquanto instrumento de Visnu, e a natureza inerte, o ingrediente original.
Nós, entidades vivas, também somos partes da mistura ativada pelo tempo. Em seu comentário ao Srimad-Bhagavatam, Vijayadvaja identifica o tempo como “o fado das almas individuais necessário para a frutificação do karma delas”. Trazendo uma idéia similar, o Bhagavatam fala sobre “o tempo que desperta o fado dos seres”. Por seu karma, ou atividades passadas, os seres vivos têm um destino a cumprir, com o tempo, sob a direção de Visnu, que os desperta e os impele a cumprirem isso. Com esta vida impelida, agora, dentro do ventre, as coisas começam a acontecer, e o tempo continua implacavelmente dirigindo cada etapa do processo criativo. O tempo, nas palavras de um comentador do Bhagavatam, “jamais pisca seus olhos”.
Estabelecer o tempo como um poder de Deus, talvez, até onde vão as definições, não satisfaça uma mente estritamente científica. Mas a abordagem do Bhagavatam certamente responde à pergunta de “onde” com sua localização teórica ou origem prévia à criação, e responde à pergunta de “o que” com a familiar condição de instrumento de Deus. Nenhuma dessas respostas contradiz completamente as afirmações de Agustinho e de Hawking de que o tempo não teria existência ou relevância antes da criação. Uma vez que o tempo no Bhagavatam está inativo antes do universo ter seu começo, e é desperto mais ou menos juntamente com a primeira fase da natureza, de certa forma, o tempo é inexistente e irrelevante antes disso. Por outro lado, o tempo no Bhagavatam não é exatamente um dos elementos criados, não tendo ainda aparecido no ventre da natureza. O tempo é uma propriedade, como Agustinho se referiria, que precede outras propriedades.
Um calendário Vaisnava de parede, trazendo momentos favoráveis e desfavoráveis para todos os tipos de atividades religiosas e também ordinárias, é uma evidência de que situar o tempo antes da criação não é suficiente para contar toda a história. O tempo está presente no ciclo das eras, e também nas atividades diárias. O tempo que impeliu a natureza talvez tenha sua origem antes do universo, mas ele também exerce sua influência nos dias após a criação, conciliando, de alguma forma, seu estado precedente e sua ocupação na criação.
Em termos de cotidiano, os adjetivos “instigante” e “comocional”, que o Bhagavatam usa para se referir ao tempo em seu aspecto primordial, poderiam ser igualmente aplicados aos efeitos que tiram a compostura mental de uma pessoa que olha o calendário ou o relógio. O mesmo tipo de força instigante está presente no trabalho dentro da mistura diária. Quando Eva Brann pergunta, “Por que eu não sei o que é o tempo?”, isto é o contraste entre o tempo como algo extremamente familiar, algo sempre presente que as pessoas diariamente reservam, desperdiçam, passam, marcam e gastam, e o tempo como algo misterioso e que dificilmente poderemos entender, que tanto agita a mente da escritora. O Bhagavatam faz uso prático dessas dinâmicas e imagens rotineiras para construir uma visão transcendental do tempo. Com sua compreensão acerca da criação, o Bhagavatam, através de um elaborado sistema chamado Sankhya, aprofunda-se no cotidiano.
Sankhya e a Compreensão do Universo
A natureza, grávida das entidades vivas, e em curso sob a força do tempo, em seguida começa a se tornar variada com elementos individuais. O Bhagavatam descreve este processo sob o título de Cosmologia Sankhya. Sankhya carrega o significado de “matemático”, e o empreendimento sistemático de Sankhya para enumerar e categorizar os elementos da natureza se assemelha grosseiramente ao empreendimento da ciência moderna em organizar a tabela periódica. Da mesma forma que a tabela periódica organiza os elementos pelo Número Atômico, que, em termos, correspondem a suas estruturas e propriedades, Sankhya descreve as propriedades de seus vinte e quatro elementos, ou categoriza seus elementos e a relação que cada um tem em relação aos outros. Em A Survey of Hinduism [sem tradução para o português], Klaus Klostermaier se refere a Sankhya como “a enumeração dos vinte e quatro elementos básicos com o objetivo de fornecer uma descrição analítica correta do universo e preparar o terreno para que se remonte a origem primeira desses elementos”. Refletindo uma motivação análoga na ciência moderna, Hawking escreve: “Nosso objetivo não é nada menos do que ter uma descrição completa do universo em que vivemos”.
O segundo e terceiro cantos do Bhagavatam apresentam grande conteúdo acerca do sistema Sankhya, com sutis diferenças na abordagem de cada um. A contagem dos elementos é às vezes vinte e quatro, às vezes vinte cinco ou vinte e sete, dependendo de como alguns elementos são subdivididos. Minha discussão aqui perfaz uma visão geral do sistema Sankhya em várias de suas acepções, incluindo uma do terceiro canto, capítulo 26, que enumera o tempo como um elemento. Para resumir, tornar curta uma longa história, os elementos aparecem em uma seqüência em particular, evoluindo de um para o outro, com uma explicação básica para tal evolução: a força do tempo e a força do destino, ou fado. Mais uma vez, tempo e destino, no Bhagavatam, se não idênticos, relacionam-se intimamente.
A Teoria da Evolução
Excetuando as similaridades básicas já apresentadas, a lista Sankhya dos elementos se difere completamente de qualquer coisa que Einstein ou Hawking aceitariam. Há cinco elementos grosseiros: terra, água, fogo, ar e éter - um tanto quanto semelhantes à lista Aristotélica (terra, água, fogo, ar), e é também o mais perto que Sankhya chega dos elementos e categorias da tabela periódica em termos de semelhança estrutural. Há, então, cinco objetos dos sentidos: som, tato, forma, sabor e odor. Então, cinco órgãos dos sentidos: ouvidos, pele, olhos, língua e nariz. Cinco sentidos funcionais: braços, pernas, sistema fonador, genitais e anus. E três elementos sutis: mente, inteligência e falso ego. Compreendem-se, assim, quatro conjuntos de cinco e um de três. Adicione o tempo para o resultado final de vinte e quatro elementos em todo o universo.
O tempo tanto movimenta a criação como é o contexto para a seqüência de seus movimentos. Dos vinte e cinco elementos acima, o Bhagavatam lista o falso-ego como o primeiro a aparecer no ventre da natureza. Do falso-ego, que “passa por modificações” devido ao fator tempo, são produzidas a mente e a inteligência. O tempo também modifica o falso-ego para produzir o som, que aparece juntamente com o éter e o ouvido. O éter evolui através do tempo para produzir outra tríade: o tato, o ar, e a pele. O ar gera a forma, o fogo e o olho. O fogo evolui para sabor, água e língua. Água se transforma no odor, na terra e no nariz. Tudo surge em uma seqüência automática determinada pelo poder do tempo, sob a distante supervisão de Visnu. Neste ponto da criação, parece haver apenas um inventário de elementos sem nenhuma organização maior. O Bhagavatam, então, vai mais além e descreve a organização das espécies de vida e sistemas planetários, tudo ainda sob o controle do tempo. O tema escolhido para ser tratado aqui, todavia, é o lugar do tempo e as propriedades que o fazem elusivo.
As Propriedades Daquele Sem Propriedades
Desta versão resumida da evolução dos elementos, pode-se notar que cada nível de três elementos inclui um sentido correspondente. Som e éter aparecem com o ouvido; tato e ar com a pele; forma e fogo (ou luz) com o olho. De acordo com a análise Sankhya, assim como a luz ilumina a forma que é percebida pelo olho, da mesma forma o éter é conectado ao som e ao ouvido. O éter “ilumina” o som percebido pelo ouvido. Ele conduz o som da mesma forma que a luz conduz a forma. Similarmente, a água conduz o sabor para a língua, e a terra origina o aroma para o nariz. A terra, de fato, como o último elemento grosseiro a evoluir, interage com todos os cinco sentidos. Você pode cheirar, saborear, ver, tocar e – como ela pode produzir som – ouvir o elemento terra. A água, o elemento que precede a terra, é inodora em sua forma pura, e, portanto, só é percebida por quatro sentidos. E assim decrescentemente até o éter no primeiro grupo de três que, junto com o som, é percebido somente por um sentido, o ouvido. Tudo isso é muito analítico. Essa apresentação foi uma forma indireta de dizer que o tempo, embora um elemento, não tem sentido ou mediador correspondente, nada para iluminá-lo ou percebê-lo diretamente. Essa é outra característica peculiar do tempo, uma que lança alguma luz no ponto de Evan Brann de porque o tempo é tão difícil de ser entendido. O tempo está presente com todos os outros elementos, uma parte essencial da mistura, mas lhe falta acesso sensorial ou afiliação.
Outra característica peculiar do tempo em Sankhya, ou talvez apenas mais uma característica de seu aspecto como destituído de sentido, é que ele não tem nenhuma propriedade especial. O Bhagavatam lista os outros vinte e três elementos juntamente com suas propriedades, muitas das quais são bastante óbvias. Dentre as propriedades da água, por exemplo, há que ela umedece, amacia, remove o calor e cansaço, e mata a sede. As propriedades do tato são macio e duro, frio e quente. O som transporta significados. E assim por diante com todos os elementos. Até mesmo a mente (pensar, meditar, desejar), a inteligência (duvidar, entender mal, chegar a conclusões), e o falso-ego (orgulho, sentimento de soberania) têm suas propriedades. O tempo não tem características como têm a terra e os outros elementos, nem é interdependente como são os outros elementos. Muitos comentadores se firmam neste ponto das propriedades, ou da ausência de propriedades. Giridhara-lala Gosvami escreve que o tempo “não é caracterizado por nenhuma peculiaridade, daí ele ser sem começo ou fim”. Como ser sem peculiaridade conduz a ser infinito não é explicado, mas outro comentador repete a mesma idéia, dizendo que o tempo “não é dependente de outra causa; ele existe em sua própria harmonia. Portanto ele é eterno”. O próprio Bhagavatam diz que o tempo “é sem fim, mas coloca fim em tudo. O tempo é sem começo, mas marca o começo de tudo. Ele é imutável”. Sem começo e sem fim, bem como a habilidade de colocar fim e marcar começo em tudo, são qualidades do tempo no Bhagavatam que, evidentemente, não são tratadas como são as propriedades dos demais elementos.
Efeitos do Tempo: Anos Luz e Milésimos de Segundo
Na versão do Bhagavatam, o tempo, sendo sem propriedades, é percebido apenas por seus efeitos. Da comoção primordial na natureza até o aparecimento e evolução dos elementos, o tempo rege começos e fins. Além do Bhagavatam, Brann também nota que “Quando se fala de tempo [...] no mundo natural, [...] normalmente é uma palavra que designa outra coisa – designa movimentos de várias espécies e suas dimensões. [...] Quando o tempo é nomeado na ciência natural, [...] ele significa um movimento padrão ou uma tendência probabilística”. O tempo do Bhagavatam estabelece o mundo como algo em movimento e o mantém em movimento enquanto permanece invisível. O comentário de Brann sobre o tempo e movimento poderia ser tomado também no sentido de que o tempo não só é visível através de seus efeitos, mas é também mensurável através dos mesmos. Seu “movimentos padrões” seria, no idioma do Sankhya, o movimento dos vinte e três elementos causado pelo tempo. E para mensurar esses movimentos, outros elementos ou objetos têm de ser usados. O relógio de pulso de Einstein, como todos os relógios padrões, são um aparelho calibrado para completar vinte e quatro voltas durante um ciclo do sol. Relógios menos usuais, como o carbono 14, também comparam movimentos de um elemento com os movimentos do sol. Praticamente qualquer elemento pode servir de relógio se seu modelo de movimento ou mudança for conhecido. Einstein foi parcial para com os anos luz. Antigas ampulhetas usavam areia. A datação do Grand Canyon foi feita usando como referência o movimento erosivo da água contra as rochas. Se o tempo perfaz a criação como a causa do movimento e da mudança, então em cada um desses casos, na perspectiva do Bhagavatam, o efeito do tempo em um objeto é comparado com o tempo do efeito em outro, e essa comparação é aceita como o tempo em si ou como medida de tempo. O Bhagavatam propõe que a transformação, mudança ou movimento de um objeto ou elemento é um efeito do tempo, não o tempo em si.
O Bhagavatam é ciente desse conceito de tempo objeto-para-objeto e oferece um leque de instrumentos para medição, do movimento dos átomos ao movimento do sol (que parece ser o principal para o Bhagavatam como é para nós). O cálculo do tempo abrange dos milésimos de segundos até o tempo da criação, que é de trilhões de anos.
Cadernos de Esportes
Em termos de definição, o tempo é elusivo. Alguns versos do Bhagavatam soam como definições. Por exemplo, o tempo é “o poder de Deus que se mantém imanifesto, mas ocupa e abrange [a natureza] e é responsável por dirigir a criação, manutenção e destruição do universo”. Ou então, o tempo é “a força propulsora que desperta o fado dos seres”. Em uma inspeção mais minuciosa, todavia, aquilo que soa como definição não é verdadeiramente definidor – final, decisivo, quintessencial. Ao invés de definições, os versos estão mais para localizações, ou atribuições do efeito de outras coisas. “O tempo ‘ocupa’ a natureza” é uma localização geral. “O tempo ‘desperta’ o fado” é uma atribuição causal. Outras supostas definições parecem definir papeis sem identificar de forma definitiva o ator. O tempo como “o poder de motivação”, por exemplo. Ou o tempo como a “causa instrumental” ou como “a arma na mão de Deus”. Isso é o que o tempo obviamente faz. De alguma forma, o Bhagavatam pode responder à declaração de Hawking sobre a relação do tempo com o universo, ou à colocação de Einstein sobre seu relógio, mas a pergunta simples de Brann sobre o que é o tempo continua em aberto.
Para os devotos de Krsna ou Visnu, uma definição padrão talvez não tenha importância. O tempo, que está além da percepção e observação empírica, é um poder de Krsna, uma das peculiaridades que faz de Deus um ser digno de adoração. Usando o tempo, Krsna como Visnu cria sem ansiedade. Várias passagens do Bhagavatam descrevem a abordagem esportiva (lilaya) de Krsna quanto à criação do universo. Um verso diz que Visnu “esportivamente procriou-se na forma do universo usando o Tempo” como Seu instrumento. Outros afirmam que “as atividades esportivas do Senhor [...] compreendem em si a preservação, origem e destruição do universo” e que através da contemplação devocional de sua “atividade esportiva” com o tempo, os seres humanos tomam aversão ao gozo dos sentidos.
Embora o Bhagavatam, bem como seus comentadores, pareçam devotar considerável atenção para o aspecto científico (no sentido de Sankhya) e filosófico do tempo, o tempo também é descrito como o instrumento de uma recreação divina com funções esportivas, independente de sua faceta misteriosa e amedrontadora. De um lado, o tempo “aterroriza os seres e reduz suas vidas”, “corta definitivamente a esperança de vida neste mundo” e espalha as pessoas assim como o vendo espalha as nuvens. Do outro lado, o tempo “não tem nenhum poder sob Deus”, cuja tendência esportiva O leva a criar repetidamente o universo.
O contraste entre esporte e terror é um pouco chocante, mas talvez se assemelhe um pouco com a discussão, de fora da tradição Védica, a respeito de como Deus pode ser bom se há sofrimento no mundo. Assim como o cristão aceita, mesmo em face ao sofrimento, que Deus é completamente bom, da mesma forma o Vaisnava aceita o esportivo Visnu como o mesmo Deus todo bondoso. Para os Vaisnavas, o Tempo na criação dá às entidades vivas a chance de buscarem suas metas pessoais vida após vida e até criação após criação. Enquanto há medo e terror envolvidos neste processo, tais coisas como sofrimento eterno ou condenação não existem. Todos têm uma chance esportiva de aprimorar sua posição na vida.
A idéia do esporte pode também servir para enfatizar a independência de um Ser Supremo. Em qualquer tradição, o aparecimento de Deus dentro da criação dificilmente levanta dúvidas sobre sua divina supremacia. Uma perspectiva derivada do Srimad-Bhagavatam é que se Deus fala através de nuvens, montanhas ou de um arbusto em chamas, ou se Ele desce como um avatara, tudo isso são atividades esportivas no sentido de que são escolhas livres e tomadas como fonte de prazer sem nenhuma possibilidade de algum resultado negativo. As atividades de Deus são plenamente voluntárias. Ele nunca fica sob o controle da natureza, que é, esta sim, controlada por Sua energia conhecida como tempo.


Tradução por Bhagavan dasa (DvS)