Dedicado a Sua Divina Graça A.C. Bhaktivedenta Swami Prabhupada e Gurudeva Srila Dhanvantari Swami

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Jagad Guru Srila Prabhupada

quinta-feira, 25 de outubro de 2007

Tempo: O Deus que Jamais Pisca Seus Olhos - Time, the Winkless God



Artigo originalmente publicado em Back to Godhead [Volta ao Supremo] – Revista fundada por Sua Divina Graça Srila Prabhupada no ano de 1944


Tempo: O Deus que Jamais Pisca Seus Olhos - Time, the Winkless God
Por Mathuresa Dasa


Tempo é algo um tanto quanto difícil de se definir. Filósofos e teólogos têm tentado por, pelo menos, vinte e cinco séculos. Albert Einstein, em meio a definições mais esotéricas em relação a outros conceitos da Física, definiu tempo como aquilo que o seu relógio de pulso marcava. Santo Agustinho disse que ele sabia o que era o tempo desde que ninguém lhe pedisse para explicá-lo. E com um ar de frustração, em seu livro What, Then, Is Time [sem tradução para o português] – cujo título também faz referência a Santo Agustinho – Eva Brann se lamenta: “Como eu posso não saber exatamente o que é algo que eu digo, reservo, gasto, marco ou desperdiço todos os dias?”.
Se não sabemos o que é o tempo, talvez possamos ao menos colocá-lo em algum lugar, ou melhor, dizer onde ele está, e onde ele não está. Em Uma Breve História do Tempo, o cientista Stephen Hawking propõe que “o conceito de tempo não tem nenhum significado antes do começo do universo”, colocando o tempo, assim, como parte integrante e inseparável do universo. Hawking cita (mais uma vez) Santo Agostinho dizendo que o tempo é propriedade do universo criado por Deus, propriedade esta que não existia antes da criação.
A literatura Védica, que abrange uma enorme gama de assuntos, também trata do tempo. O Srimad-Bhagavatam, em particular, traz relevantes considerações acerca do local e função do tempo dentro da criação do universo. Algumas partes do Bhagavatam confirmam e outras contradizem as afirmações de Hawking, Einstein, Agustinho e outros, enquanto oferece uma abordagem ímpar sobre o assunto.
O Bhagavatam ensina que o Senhor Krsna, em sua forma de Visnu, é responsável pela criação. Embora Brahma e Siva também tenham seus papeis, o poder deles vem do Senhor Visnu. Apenas Ele existe antes da criação, quando a natureza é um atributo sutil de Sua pessoa, e o tempo está em um estado inativo - na forma de um de Seus poderes. Através de seus próprios atributos e poderes, o Senhor Visnu cria o universo, que é, portanto, idêntico a Ele, enquanto que Ele permanece inalterado e plenamente independente. Ele mantém a criação, sem a necessidade de nenhum esforço, por um inimaginável período de tempo, depois a destrói e a absorve para dentro de Si, e em seguida a cria novamente.
Isto acontece repetidas vezes, e, após cada destruição, Visnu fica sozinho. Ou quase isso. Visnu tem uma morada eterna, além da criação e destruição da matéria, onde Seus devotos perfeitos vivem em Sua companhia. Visnu dá a esses devotos corpos divinos e plenamente livres de aflições, decorados com coroas e guirlandas: como o Seu. Eles residem com Ele eternamente, livres do perigo de renascer em um universo temporário. De qualquer forma, o Senhor Visnu, algumas vezes, visita pessoalmente Sua criação, e algumas de Suas vindas como avatara são descritas no Bhagavatam. Esses avataras vêem para salvar o mundo, protegendo os bons e destruindo aqueles de mentalidade perversa, enquanto estabelecem o dharma. O Senhor Visnu desce, portanto, por Seu desejo pessoal, não como as subordinadas almas individuais, que ficam todas sob o controle do karma ao entrarem no universo no começo da criação.
Esse ciclo de criações anda junto com o recorrente tema do tempo circular que é descrito na literatura Védica. As eras de Satya, Treta, Dvapara e Kali se revezam como as estações. As entidades vivas individuais giram pelo ciclo de nascimentos e mortes em diferentes corpos. A criação e a destruição do universo também acontecem repetidamente.
Tempo Como um Fator Instrumental
O Srimad-Bhagavatam narra que quando a criação do universo está sendo iniciada, a natureza se manifesta de Visnu em um estado inerte e abstrato. Ainda sem nenhum elemento, sem ar ou água, nada está acontecendo. Visnu usa Seu poder do tempo para causar uma “comoção” na natureza, e a insemina com uma grande quantidade de entidades vivas individuais, ou almas, ainda sem corpos. Essa inseminação faz a criação continuar. A metáfora de uma gravidez é performática, com as entidades vivas agora no ventre da natureza, e com o tempo como um “fator instigador”, claramente exercendo o papel central de, se ainda não precisamente especificado, misturador dos elementos. O tempo é uma causa original enquanto instrumento de Visnu, e a natureza inerte, o ingrediente original.
Nós, entidades vivas, também somos partes da mistura ativada pelo tempo. Em seu comentário ao Srimad-Bhagavatam, Vijayadvaja identifica o tempo como “o fado das almas individuais necessário para a frutificação do karma delas”. Trazendo uma idéia similar, o Bhagavatam fala sobre “o tempo que desperta o fado dos seres”. Por seu karma, ou atividades passadas, os seres vivos têm um destino a cumprir, com o tempo, sob a direção de Visnu, que os desperta e os impele a cumprirem isso. Com esta vida impelida, agora, dentro do ventre, as coisas começam a acontecer, e o tempo continua implacavelmente dirigindo cada etapa do processo criativo. O tempo, nas palavras de um comentador do Bhagavatam, “jamais pisca seus olhos”.
Estabelecer o tempo como um poder de Deus, talvez, até onde vão as definições, não satisfaça uma mente estritamente científica. Mas a abordagem do Bhagavatam certamente responde à pergunta de “onde” com sua localização teórica ou origem prévia à criação, e responde à pergunta de “o que” com a familiar condição de instrumento de Deus. Nenhuma dessas respostas contradiz completamente as afirmações de Agustinho e de Hawking de que o tempo não teria existência ou relevância antes da criação. Uma vez que o tempo no Bhagavatam está inativo antes do universo ter seu começo, e é desperto mais ou menos juntamente com a primeira fase da natureza, de certa forma, o tempo é inexistente e irrelevante antes disso. Por outro lado, o tempo no Bhagavatam não é exatamente um dos elementos criados, não tendo ainda aparecido no ventre da natureza. O tempo é uma propriedade, como Agustinho se referiria, que precede outras propriedades.
Um calendário Vaisnava de parede, trazendo momentos favoráveis e desfavoráveis para todos os tipos de atividades religiosas e também ordinárias, é uma evidência de que situar o tempo antes da criação não é suficiente para contar toda a história. O tempo está presente no ciclo das eras, e também nas atividades diárias. O tempo que impeliu a natureza talvez tenha sua origem antes do universo, mas ele também exerce sua influência nos dias após a criação, conciliando, de alguma forma, seu estado precedente e sua ocupação na criação.
Em termos de cotidiano, os adjetivos “instigante” e “comocional”, que o Bhagavatam usa para se referir ao tempo em seu aspecto primordial, poderiam ser igualmente aplicados aos efeitos que tiram a compostura mental de uma pessoa que olha o calendário ou o relógio. O mesmo tipo de força instigante está presente no trabalho dentro da mistura diária. Quando Eva Brann pergunta, “Por que eu não sei o que é o tempo?”, isto é o contraste entre o tempo como algo extremamente familiar, algo sempre presente que as pessoas diariamente reservam, desperdiçam, passam, marcam e gastam, e o tempo como algo misterioso e que dificilmente poderemos entender, que tanto agita a mente da escritora. O Bhagavatam faz uso prático dessas dinâmicas e imagens rotineiras para construir uma visão transcendental do tempo. Com sua compreensão acerca da criação, o Bhagavatam, através de um elaborado sistema chamado Sankhya, aprofunda-se no cotidiano.
Sankhya e a Compreensão do Universo
A natureza, grávida das entidades vivas, e em curso sob a força do tempo, em seguida começa a se tornar variada com elementos individuais. O Bhagavatam descreve este processo sob o título de Cosmologia Sankhya. Sankhya carrega o significado de “matemático”, e o empreendimento sistemático de Sankhya para enumerar e categorizar os elementos da natureza se assemelha grosseiramente ao empreendimento da ciência moderna em organizar a tabela periódica. Da mesma forma que a tabela periódica organiza os elementos pelo Número Atômico, que, em termos, correspondem a suas estruturas e propriedades, Sankhya descreve as propriedades de seus vinte e quatro elementos, ou categoriza seus elementos e a relação que cada um tem em relação aos outros. Em A Survey of Hinduism [sem tradução para o português], Klaus Klostermaier se refere a Sankhya como “a enumeração dos vinte e quatro elementos básicos com o objetivo de fornecer uma descrição analítica correta do universo e preparar o terreno para que se remonte a origem primeira desses elementos”. Refletindo uma motivação análoga na ciência moderna, Hawking escreve: “Nosso objetivo não é nada menos do que ter uma descrição completa do universo em que vivemos”.
O segundo e terceiro cantos do Bhagavatam apresentam grande conteúdo acerca do sistema Sankhya, com sutis diferenças na abordagem de cada um. A contagem dos elementos é às vezes vinte e quatro, às vezes vinte cinco ou vinte e sete, dependendo de como alguns elementos são subdivididos. Minha discussão aqui perfaz uma visão geral do sistema Sankhya em várias de suas acepções, incluindo uma do terceiro canto, capítulo 26, que enumera o tempo como um elemento. Para resumir, tornar curta uma longa história, os elementos aparecem em uma seqüência em particular, evoluindo de um para o outro, com uma explicação básica para tal evolução: a força do tempo e a força do destino, ou fado. Mais uma vez, tempo e destino, no Bhagavatam, se não idênticos, relacionam-se intimamente.
A Teoria da Evolução
Excetuando as similaridades básicas já apresentadas, a lista Sankhya dos elementos se difere completamente de qualquer coisa que Einstein ou Hawking aceitariam. Há cinco elementos grosseiros: terra, água, fogo, ar e éter - um tanto quanto semelhantes à lista Aristotélica (terra, água, fogo, ar), e é também o mais perto que Sankhya chega dos elementos e categorias da tabela periódica em termos de semelhança estrutural. Há, então, cinco objetos dos sentidos: som, tato, forma, sabor e odor. Então, cinco órgãos dos sentidos: ouvidos, pele, olhos, língua e nariz. Cinco sentidos funcionais: braços, pernas, sistema fonador, genitais e anus. E três elementos sutis: mente, inteligência e falso ego. Compreendem-se, assim, quatro conjuntos de cinco e um de três. Adicione o tempo para o resultado final de vinte e quatro elementos em todo o universo.
O tempo tanto movimenta a criação como é o contexto para a seqüência de seus movimentos. Dos vinte e cinco elementos acima, o Bhagavatam lista o falso-ego como o primeiro a aparecer no ventre da natureza. Do falso-ego, que “passa por modificações” devido ao fator tempo, são produzidas a mente e a inteligência. O tempo também modifica o falso-ego para produzir o som, que aparece juntamente com o éter e o ouvido. O éter evolui através do tempo para produzir outra tríade: o tato, o ar, e a pele. O ar gera a forma, o fogo e o olho. O fogo evolui para sabor, água e língua. Água se transforma no odor, na terra e no nariz. Tudo surge em uma seqüência automática determinada pelo poder do tempo, sob a distante supervisão de Visnu. Neste ponto da criação, parece haver apenas um inventário de elementos sem nenhuma organização maior. O Bhagavatam, então, vai mais além e descreve a organização das espécies de vida e sistemas planetários, tudo ainda sob o controle do tempo. O tema escolhido para ser tratado aqui, todavia, é o lugar do tempo e as propriedades que o fazem elusivo.
As Propriedades Daquele Sem Propriedades
Desta versão resumida da evolução dos elementos, pode-se notar que cada nível de três elementos inclui um sentido correspondente. Som e éter aparecem com o ouvido; tato e ar com a pele; forma e fogo (ou luz) com o olho. De acordo com a análise Sankhya, assim como a luz ilumina a forma que é percebida pelo olho, da mesma forma o éter é conectado ao som e ao ouvido. O éter “ilumina” o som percebido pelo ouvido. Ele conduz o som da mesma forma que a luz conduz a forma. Similarmente, a água conduz o sabor para a língua, e a terra origina o aroma para o nariz. A terra, de fato, como o último elemento grosseiro a evoluir, interage com todos os cinco sentidos. Você pode cheirar, saborear, ver, tocar e – como ela pode produzir som – ouvir o elemento terra. A água, o elemento que precede a terra, é inodora em sua forma pura, e, portanto, só é percebida por quatro sentidos. E assim decrescentemente até o éter no primeiro grupo de três que, junto com o som, é percebido somente por um sentido, o ouvido. Tudo isso é muito analítico. Essa apresentação foi uma forma indireta de dizer que o tempo, embora um elemento, não tem sentido ou mediador correspondente, nada para iluminá-lo ou percebê-lo diretamente. Essa é outra característica peculiar do tempo, uma que lança alguma luz no ponto de Evan Brann de porque o tempo é tão difícil de ser entendido. O tempo está presente com todos os outros elementos, uma parte essencial da mistura, mas lhe falta acesso sensorial ou afiliação.
Outra característica peculiar do tempo em Sankhya, ou talvez apenas mais uma característica de seu aspecto como destituído de sentido, é que ele não tem nenhuma propriedade especial. O Bhagavatam lista os outros vinte e três elementos juntamente com suas propriedades, muitas das quais são bastante óbvias. Dentre as propriedades da água, por exemplo, há que ela umedece, amacia, remove o calor e cansaço, e mata a sede. As propriedades do tato são macio e duro, frio e quente. O som transporta significados. E assim por diante com todos os elementos. Até mesmo a mente (pensar, meditar, desejar), a inteligência (duvidar, entender mal, chegar a conclusões), e o falso-ego (orgulho, sentimento de soberania) têm suas propriedades. O tempo não tem características como têm a terra e os outros elementos, nem é interdependente como são os outros elementos. Muitos comentadores se firmam neste ponto das propriedades, ou da ausência de propriedades. Giridhara-lala Gosvami escreve que o tempo “não é caracterizado por nenhuma peculiaridade, daí ele ser sem começo ou fim”. Como ser sem peculiaridade conduz a ser infinito não é explicado, mas outro comentador repete a mesma idéia, dizendo que o tempo “não é dependente de outra causa; ele existe em sua própria harmonia. Portanto ele é eterno”. O próprio Bhagavatam diz que o tempo “é sem fim, mas coloca fim em tudo. O tempo é sem começo, mas marca o começo de tudo. Ele é imutável”. Sem começo e sem fim, bem como a habilidade de colocar fim e marcar começo em tudo, são qualidades do tempo no Bhagavatam que, evidentemente, não são tratadas como são as propriedades dos demais elementos.
Efeitos do Tempo: Anos Luz e Milésimos de Segundo
Na versão do Bhagavatam, o tempo, sendo sem propriedades, é percebido apenas por seus efeitos. Da comoção primordial na natureza até o aparecimento e evolução dos elementos, o tempo rege começos e fins. Além do Bhagavatam, Brann também nota que “Quando se fala de tempo [...] no mundo natural, [...] normalmente é uma palavra que designa outra coisa – designa movimentos de várias espécies e suas dimensões. [...] Quando o tempo é nomeado na ciência natural, [...] ele significa um movimento padrão ou uma tendência probabilística”. O tempo do Bhagavatam estabelece o mundo como algo em movimento e o mantém em movimento enquanto permanece invisível. O comentário de Brann sobre o tempo e movimento poderia ser tomado também no sentido de que o tempo não só é visível através de seus efeitos, mas é também mensurável através dos mesmos. Seu “movimentos padrões” seria, no idioma do Sankhya, o movimento dos vinte e três elementos causado pelo tempo. E para mensurar esses movimentos, outros elementos ou objetos têm de ser usados. O relógio de pulso de Einstein, como todos os relógios padrões, são um aparelho calibrado para completar vinte e quatro voltas durante um ciclo do sol. Relógios menos usuais, como o carbono 14, também comparam movimentos de um elemento com os movimentos do sol. Praticamente qualquer elemento pode servir de relógio se seu modelo de movimento ou mudança for conhecido. Einstein foi parcial para com os anos luz. Antigas ampulhetas usavam areia. A datação do Grand Canyon foi feita usando como referência o movimento erosivo da água contra as rochas. Se o tempo perfaz a criação como a causa do movimento e da mudança, então em cada um desses casos, na perspectiva do Bhagavatam, o efeito do tempo em um objeto é comparado com o tempo do efeito em outro, e essa comparação é aceita como o tempo em si ou como medida de tempo. O Bhagavatam propõe que a transformação, mudança ou movimento de um objeto ou elemento é um efeito do tempo, não o tempo em si.
O Bhagavatam é ciente desse conceito de tempo objeto-para-objeto e oferece um leque de instrumentos para medição, do movimento dos átomos ao movimento do sol (que parece ser o principal para o Bhagavatam como é para nós). O cálculo do tempo abrange dos milésimos de segundos até o tempo da criação, que é de trilhões de anos.
Cadernos de Esportes
Em termos de definição, o tempo é elusivo. Alguns versos do Bhagavatam soam como definições. Por exemplo, o tempo é “o poder de Deus que se mantém imanifesto, mas ocupa e abrange [a natureza] e é responsável por dirigir a criação, manutenção e destruição do universo”. Ou então, o tempo é “a força propulsora que desperta o fado dos seres”. Em uma inspeção mais minuciosa, todavia, aquilo que soa como definição não é verdadeiramente definidor – final, decisivo, quintessencial. Ao invés de definições, os versos estão mais para localizações, ou atribuições do efeito de outras coisas. “O tempo ‘ocupa’ a natureza” é uma localização geral. “O tempo ‘desperta’ o fado” é uma atribuição causal. Outras supostas definições parecem definir papeis sem identificar de forma definitiva o ator. O tempo como “o poder de motivação”, por exemplo. Ou o tempo como a “causa instrumental” ou como “a arma na mão de Deus”. Isso é o que o tempo obviamente faz. De alguma forma, o Bhagavatam pode responder à declaração de Hawking sobre a relação do tempo com o universo, ou à colocação de Einstein sobre seu relógio, mas a pergunta simples de Brann sobre o que é o tempo continua em aberto.
Para os devotos de Krsna ou Visnu, uma definição padrão talvez não tenha importância. O tempo, que está além da percepção e observação empírica, é um poder de Krsna, uma das peculiaridades que faz de Deus um ser digno de adoração. Usando o tempo, Krsna como Visnu cria sem ansiedade. Várias passagens do Bhagavatam descrevem a abordagem esportiva (lilaya) de Krsna quanto à criação do universo. Um verso diz que Visnu “esportivamente procriou-se na forma do universo usando o Tempo” como Seu instrumento. Outros afirmam que “as atividades esportivas do Senhor [...] compreendem em si a preservação, origem e destruição do universo” e que através da contemplação devocional de sua “atividade esportiva” com o tempo, os seres humanos tomam aversão ao gozo dos sentidos.
Embora o Bhagavatam, bem como seus comentadores, pareçam devotar considerável atenção para o aspecto científico (no sentido de Sankhya) e filosófico do tempo, o tempo também é descrito como o instrumento de uma recreação divina com funções esportivas, independente de sua faceta misteriosa e amedrontadora. De um lado, o tempo “aterroriza os seres e reduz suas vidas”, “corta definitivamente a esperança de vida neste mundo” e espalha as pessoas assim como o vendo espalha as nuvens. Do outro lado, o tempo “não tem nenhum poder sob Deus”, cuja tendência esportiva O leva a criar repetidamente o universo.
O contraste entre esporte e terror é um pouco chocante, mas talvez se assemelhe um pouco com a discussão, de fora da tradição Védica, a respeito de como Deus pode ser bom se há sofrimento no mundo. Assim como o cristão aceita, mesmo em face ao sofrimento, que Deus é completamente bom, da mesma forma o Vaisnava aceita o esportivo Visnu como o mesmo Deus todo bondoso. Para os Vaisnavas, o Tempo na criação dá às entidades vivas a chance de buscarem suas metas pessoais vida após vida e até criação após criação. Enquanto há medo e terror envolvidos neste processo, tais coisas como sofrimento eterno ou condenação não existem. Todos têm uma chance esportiva de aprimorar sua posição na vida.
A idéia do esporte pode também servir para enfatizar a independência de um Ser Supremo. Em qualquer tradição, o aparecimento de Deus dentro da criação dificilmente levanta dúvidas sobre sua divina supremacia. Uma perspectiva derivada do Srimad-Bhagavatam é que se Deus fala através de nuvens, montanhas ou de um arbusto em chamas, ou se Ele desce como um avatara, tudo isso são atividades esportivas no sentido de que são escolhas livres e tomadas como fonte de prazer sem nenhuma possibilidade de algum resultado negativo. As atividades de Deus são plenamente voluntárias. Ele nunca fica sob o controle da natureza, que é, esta sim, controlada por Sua energia conhecida como tempo.


Tradução por Bhagavan dasa (DvS)

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